sábado, 1 de junho de 2013

pensamentos do finado maio

A partir de certo momento os valores se invertem, quando menos se espera.Exemplo: com a passagem do tempo, podemos ter duas pessoas que fincaram um pacto conjugal,  onde a sagrada instituição deixou de ser o casamento e passou a ser o adultério.O que antes era sagrado passa então a ser um profano "enrustido".

     Sempre digo que nada nos garante que a felicidade humana faça parte do projeto da natureza. Tanto mais que a natureza parece não ter projeto algum, apenas se move na auto-continuidade de si própria. O universo parece assim se mover.Acaba, começa, acaba, começa. Mas para os que insistem em dizer que de início surgiu o verbo, eu tenho lá minhas convicções de que no universo predomina o advérbio. Verbo, quando muito defectivo.

   Eu me faço a partir do espelho que imagino refletir aquilo que penso ser minha imagem.Logo, nada impede desse  espelho ser opaco.Em algum momento, pelo menos, ele o será.



Silogismo idealista:
Eu a amo, você me ama; logo, nos amamos

Silogismo masoquista:

Eu a amo, você não me ama; ainda assim eu a amo.

Silogismo realista:
Eu a amo, você não me ama; logo, eu a odeio.

Silogismo ceticista:
Eu a amo, você me ama; logo, podemos nos odiar.

Silogismo alternativo:
Eu a odeio, você me odeia; logo, nos amamos.

Dicas básicas para roteiros de filmes básicos.Pouco lógicos: não sujeitos a silogismos. Aliás, funcionasse por silogismo, o amor não seria o que é e sim seria uma equação com solução através de números imaginários. Afinal, constitui-se de números irracionais.

Sempre gostei de ler coisas de filosofia, não por acreditar achar ali solução para meus dilemas e contradições, mas como um tipo de exercício estético do pensamento.Salvo, evidente, quando o assunto envolvia lógica.No fundo, uma maneira de usar o cérebro de forma irracional para combater o irracional que está lá dentro.Mas não adianta: o reprimido sempre volta.Ainda bem que faço minhas traquinagens artísticas que, mesmo que sejam medíocres, pelo menos evitam que eu mate um medíocre por aí.

É o que mais ouço por aí: essa cidade deixa as pessoas meio ariscas, ninguém confia em ninguém.
     A se lembrar que já Freud alertava que o ser humano é meio inconfiável, pois se relaciona a partir da ponta de cima do iceberg; a maior parte, a submersa, os instintos, essa fica abaixo da linha d'água.Outros pensadores ou artistas já tinham dito isso, de maneiras diversas, em outras épocas.
    Tem gente que acha que o ser humano é bom, a sociedade é que o estraga; há os que o vêem como inerentemente mau; finalmente, há os que enxergam tanto aspectos negativos como positivos, nem mau, nem bom, o que me parece mais razoável pelas frágeis evidências,Sei que, quando mais novo, confiava mais nas pessoas; hoje, mais realista, não vejo aquele otimismo de juventude como algo ruim, e sim como um aspecto de "pureza" que, de certa maneira, me poupou de desprezar meu semelhante agora na maturidade,Por sinal, diga-se a bem da verdade, com profundo esforço.E sem acreditar em deus ou em vida depois da morte, o que complica mais as coisas, inclusive com seu próprio semelhante.

   Em termos de relação humana, prefiro até uma pessoa que acredita em deus – descontados, obviamente, os fanatismos -do que uma que finge não acreditar mas se comporta como quem acredita. Aí é dose! Esse tipo de gente nos confunde, não sabemos como agir, como falar sem que sejam maculadas suas convicções. Certas formas de farsa me irritam. Ou se acredita ou não, ou se tem fé ou não; pior é justificar fé por meio racional.Depois agir irracionalmente. Então que fique só mesmo no discurso de pensamento.Pascal tentou isso com brilho e não conseguiu, a meu ver; produziu, com isso, bela literatura filosófica.Mas, afinal, era Pascal, um pensador genial que, mesmo sendo seus Pensamentos livro meu de cabeceira por um tempo, não conseguiu me convencer da existência de deus.Mas foi coerente com o que disse ou fez em sua vida. E certa coerência é sempre admirável; não gosto dos que ficam pela metade, não chegam até o fim, ficam sempre no estágio morno, inclusive nas posições filosóficas ou éticas.
      Quem já matou deus dentro de si, pode se resignar, não adianta, nunca mais terá paz consoladora, viverá sempre entre o absurdo e o nada, será sempre um trágico; não mais fará  as pazes com a projeção de si dentro da imagem de um deus que forjaram para sua consciência.Terá só a si próprio e as encruzilhadas em que se criou.

Como não acreditar na recuperação das pessoas se consegui me recuperar de minha própria pessoa?  A qual, pessoalmente, sempre achei um caso perdido para o mundo.Bem, talvez eu já seja um caso perdido e nem me toquei disso. Ou talvez o mundo todo já esteja perdido e não saiba.Tanto faz.

Às vezes fico divagando em conversas com amigos, desfiando minhas interpretações pessoais sobre psicanálise, filosofia ou outra maluquice qualquer e, quando solto a idéia de que acho que o futuro vai dar mais espaço para a bissexualidade, que os papéis tradicionais(pelo menos no ocidente) estão com os dias contados(mas, os dias, ainda podem ser muitos e muitos...) em função das transformações sociais, econômicas e psicológicas, com tudo em mutação, as relações e instituições com constituição de geléia; falo de como as coisas eram mais difusas nessa área na Grécia antiga, do padrão andrógino  dos valores estéticos gregos, da idéia de virilidade na cultura clássica da antiguidade, da feminilidade de temperamento de alguns poetas e artistas, e blá,blá,blá.Mais hora menos hora, nove em dez dentre esses com quem converso sobre isso me lança a pergunta: Sérgio, o que aconteceu,você virou gay? Aí concluo que o cara não entendeu nada do que eu falava.Que fazer!A gente tem que saber com quem conversa.E saber dos limites da conversa.

     E se os sentimentos das pessoas forem como as vozes por elas emitidas? Podem se atravessar, uma pela outra, sem que uma interfira na outra, uma pessoa ou outra podendo fingir que não escutou direito o que a outra falou. E mesmo assim, o ar vibrou.

    Quando vejo casais que se sustentaram, em meio aos grilhões  de circunstâncias que os uniram, em anos e anos decorridos de tortura mútua e compartilhada, experiências  perdidas - senão com outros , pelo menos entre os próprios cônjuges que, sozinhos, poderiam fruir de coisa melhor - , sem contar os trágicos eventos de rebentos colocados no mundo, ao relento das neuroses partilhadas de forma familiar, penso na sobriedade e profundidade da frase "antes só que mal acompanhado".São nessas horas que vejo como a família devia ser vista como algo sagrado. Um outro tipo de sagrado, longe dos preceitos de sociedade ou religião.Mas hoje esse tipo de família não subsiste. Algo, hoje, banalizado como tudo. Mas então por quê levar a vida de forma banal? Com isso apenas reproduzimos a forma como a natureza nos trata: da mesma forma banal com que trata insetos ou plantas, a mesma indiferença  que faz com que os elementos passem por cima de nós.

Ah, essas pessoas de bem, decentes, de cidadania bem cumprida, doces, suaves que, repentinamente, emitem uma opinião digna de um nazista convicto da SS.... Que fazer, a humanidade é assim mesmo. Por isso as soluções têm sempre que ser coletivas e com leis, porque aí existe a possibilidade de que a razão dê a linha das coisas .Por isso não acredito no anarquismo como método político. Porque, solto e no plano meramente individual, o ser humano é uma fera perigosa e agressiva, o egoísmo sem barreiras ditando a regra, a irracionalidade destrutiva ameaçando o que há ao seu redor, engolindo, com isso, toda possibilidade de bondade, generosidade ou amor que existem dentro desse ser .E que se deixe a anarquia para a arte, para os nossos sonhos ou costumes, desde que não fira ninguém .Mas aí, aquela pessoa de bem, decente, etc, pode também não gostar e pensar como um moralista inquisidor .Simplesmente porque a liberdade e o exercício da razão parecem constranger o cidadão comum-zé-ninguém desse nosso mundo doido.


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