domingo, 29 de abril de 2012

Auto retrato a tinta
maternidade lunar

Para a juventude o tempo não existe praticamente.Podem-se jogar alguns anos fora e ainda nos restam muitos, muita coisa pela frente, a morte sempre sendo uma possibilidade maior para os outros.Quanto mais o tempo passa, mais cada ano perdido ganha significado.E, quando menos se espera, poucos anos nos esperam, os erros e ausências nos pesam mais.E o sopro da juventude se esvai, como um simples vento que passou repentino.

figura feminina com feras

segunda-feira, 23 de abril de 2012








    
Fragmentos pensados de uma obra deliberadamente fragmentada


 Como vivemos um estado de constante comédia humana, somos vítimas de interpretações duvidosas de atores de talento igualmente duvidoso.O grande problema está no instante em que as máscaras caem e vemos o que está por trás das atitudes de fachada:  muitas vezes o grotesco, o assustador, o vazio.Pior: não adianta reclamar da direção nem cobrar a volta do ingresso.De minha parte, contudo, prefiro meu amadorismo sem pretensão.





     Por mais moucos  que sejam nossos ouvidos, nosso coração nunca  deixa de ouvir os estranhos ruídos que emanam das harmonias das esferas.Nem todo ruído causado pela balbúrdia do mundo consegue encobrir nossa misteriosa escuta oculta.


     A avidez por coisas novas  quase que nos podam, nessa existência atual de pouca contemplação, de ver a beleza que se oferece aos nossos olhos.Acabamos por não ver essa beleza e sim apenas sua tradução.Ela passa ao nosso lado e não a vemos, não pela ausência de olhos mas sim pela ausência de olhar.


Jt1

    Lendo o noticiário cotidiano, ouso afirmar que, fossem os símios mais unidos e conscientes, processariam  Darwin por calúnia e difamação.

 Se o homem é um contínuo de  fragmentações porque exigir-se que o seja unitário no amor?

     A crueldade tende a ser espontânea, desorganizada.Quando se organiza vira coisas como os nazismos ou ditaduras mil espalhadas pelo mundo e pelo tempo.


     A pior forma de ditadura é a que antecipa  o surgimento da vontade  de liberdade do outro.

    Por trás de cada pacato cidadão esconde-se a latência de uma víbora  digna de um ditador..Por isso o povo é essa víbora de tantos tentáculos.





Há uma vantagem em se produzir algo, artisticamente,  não posto em público, apenas em particular: se for uma grande porcaria você acaba por ignorar-lhe o valor, seja pela condescendência de conhecidos ou pelo autocentrismo da alienção.Chamo isso de esquizofrenia controlada ou síndrome de falsa genialidade.


A mania de se emitir frequentemente juízos de valor pode apenas demonstrar uma autêntica falta de juízo.

Quando nos consideramos loucos, boa coisa é uma visita a algum
hospício.Fica-se em dúvida se a porta é de entrada ou saída, de onde estamos entrando ou saindo de fato.Porque de direito todos somos loucos em alguma medida.

As leis da evolução têm sua contraprova em muitos conhecidos nossos do dia a dia.

     Em matéria de amor os fins não  justificam os meios , e sim estes é que dão sentido aos fins.


A paciência pode servir para amadurecer o prazer.Mas o prazer pode fazer apodrecer a paciência.


     Todos  veneram o  culto aos artistas loucos, fracassados ou atormentados em vida.Mas só aos famosos e conhecidos é concedido a honra.E quanto à multidão de anônimos que soçobraram nas mesmas silenciosas águas onde hoje descansam os famosos de hoje, desconhecidos de ontem , todos igualmente loucos, fracassados e atormentados? Não seria o fracasso a condição natural de vida?

JT








Quem sabe por padecer de idealismo compulsivo, não consigo levar muito a sério essas formas de amor disponíveis e predominantes por aí.Afinal, com freqüência discurso se contrapõe à prática.Essa mistura de sexo normatizado, economia, discurseira demagógica, mentira e  medo, que pouco ameaça a integridade dos agentes econômicos ou a ordem das coisas no sistema, isso não me atrai muito.Uma vã postura, pode ser. Não transigir em certos valores, por nós cultivados,  pelo menos pode servir a um peso menor de consciência.
      Civilização vive de instintos controlados.Não há progresso sem alguma forma de repressão.Mas o tédio acaba por ser o efeito colateral que pode se transfigurar de várias maneiras.No fundo, todos querem paz e conforto, coisas que têm “preço” a ser pago, ainda que seja nossa alma.O Mefistófoles que negocia conosco é bem criterioso e conta com o aval de todos os demônios do “progresso”, ainda que isso custe-nos uma parcela significativa do que restou de nossa alma , desabada no paraíso do consumo,  esperando uma redenção pelas fórmulas mais simples que os milagres da ciência providenciarão.
 sm






Ser só é ser de si mesmo o mais que possível de se ser o que se é.
O máximo do que se é sempre será o mínimo do que se pode ser.
Somente sendo o que se é nos transformamos naquilo que podemos ser.

jt





Intervalo de descanso e conversa no atelier.Reflexão: na verdade nunca falta amor na arte; o que falta é, em geral, arte no amor.Porque, em potência,  o amor  é vida, a arte corrige a vida.Estetizado, o amor é intelectual, realizado é animal.Falta de amor é sempre um pouco de falta de arte na vida.
     Ficam lá esses artistas que, desde que não muito domesticados ou hipnotizados pela grana, se debatem na própria estranheza de ser, discutindo isso em meio aos problemas de grana e das mesquinharias que preenchem o cotidiano.Mas quem é que não é um pouco estranho para si mesmo?Tanto faz, animal ou intelectual, o amor é sempre estranheza.Faz-nos cair do pedestal de nossas certezas.Estátuas são coisas duras, para viver ao sol e sob o vento, como pessoas, embora estas sejam em si vida, enquanto as outras são uma interpretação da vida.E interpretar, senão ajuda a compreender, pelo menos nos serve para aprender a aceitação.


Minha metade domesticada continua se debatendo- a bem da verdade, diga-se: em vão! – com os meus demônios do cotidiano e da alma por questões evidentemente...domésticas.

Jt







     Por nossos fracassos e sonhos quebrados, somos condenados ao exílio de nossa desesperança.Por nossa teimosia e vontade, somos condenados a empurrar rochas por crimes não cometidos.
    
     A vida é como um experimento por onde passamos, inadvertidamente, involuntariamente.É  uma viagem por onde o espírito transita através da matéria.”E como o espírito é que viaja, é nele que se vive”.Pensar o que se vê é estar no que é visto.Viver sem pensar é como viajar com os sentidos desligados.Em verdade viveu muito quem pensou muito, numa dimensão de universo imaginário que nos chega em parte pelas obras e criações de cultura que o indivíduo deixa.De nada adianta viver muitas coisas ou passar por muitas situações sem que o risco da morte esteja amealhado, ainda que seja simbólico ou imaginário.O risco existe em tudo, vivemos oscilando entre a perda da vida e da sanidade(mental?Será que existe?).Entre a matéria que pensamos ver, e o espírito que pensamos controlar, claudicamos com os instrumentos de cultura com que a civilização nos ilude, para continuar sua jornada de insignificância na vastidão do universo.

 Andando pela noite.O mundo é mesmo teatro(do absurdo?): as pessoas são como atores no palco; estão lá, mas não são o que vemos.Os enredos até que podem ser bons, mas as encenações são sempre defeituosas.Por isso se paga teatro: para se fugir do amadorismo da vida.Mentira por mentira, é preferível uma bem concatenada.Há mentira mais verdadeira que a verdade.










Cada vez mais creio que a sinceridade, além de ser exercida por pessoas “francas”, só é possível realmente às pessoas fortes.Para alguns, o espelho é mais do que um objeto de ornamentação; acaba sendo um cruel confessor.Não há forma de ser sincero sem ser cruel consigo mesmo ou com os outros.Mas muita sinceridade não passa de uma forma de ornamento social.Por isso o silêncio pode ser uma grande forma de eloqüência.







Como em algumas artes, nossa vida talvez se desenrole em torno de uma quadra envolvendo solidez, tempo, espaço e profundidade.A solidez é difícil porque tudo se desmancha ao redor, tudo é fluido.O tempo nos escapa pelas mãos.O espaço é sempre um mistério relativo e a profundidade frequentemente nos é negada pelas mazelas do cotidiano.

Como sempre digo, uma mulher pode não levar mais de dez segundos para decidir o que pode fazer com um homem.No entanto, há muito homem que pode levar mais de dez anos para descobrir o que não pode fazer com ela.

Dilema:são as afinidades e não as diferenças que aproximam mais  as pessoas; contudo são as diferenças que produzem aquelas atrações inexplicáveis que nos confundem e fascinam.Há algum critério objetivo e científico, à luz da sabedoria dos especialistas, que explique isso?A vida não se organiza por simetrias e sim por assimetrias.A cara metade ideal não seria mais que um simples ideal.

Acabado esse festival de futilidades do casamento real britânico, penso o seguinte: o único erro  da revolução inglesa de 1648 foi, depois de cortar a cabeça do rei, não cortar as cabeças do resto da nobreza parasitária.Pena que Cromwell tenha morrido antes do tempo.Os franceses acabaram sendo mais eficientes com sua guilhotina.


Na balança da (in)justiça metafísica do mundo equilibrar o “som e a fúria” do individualismo romântico com a reticência clássica do “não em estrondo mas em lamúria” não é tarefa fácil.