terça-feira, 7 de março de 2017

Caminho fácil para um professor perder alunos de arte

Como perder alunos de arte :
A coisa, profissionalmente falando, que mais fiz até hoje foi dar aula.Inicialmente de Física, depois de arte, a partir do momento em que arte passou a ser a coisa mais importante para mim.Por outro lado, sempre padeci de certos idealismos que sempre comprometeram meu bem estar.Principalmente o emocional. Nem vale a pena discorrer sobre o tema aqui.Afinal, pragmatismo nunca foi mesmo o meu forte.Agora vejam só que situação complicada em que eu me colocava, quando ainda dava aulas de arte: para a garotada eu falava que, caso sentissem muito prazer naquele fazer ou aprendizado artístico, podiam articular isso com formas de sobrevivência no futuro, dado o fato que o prazer estético é praticamente uma necessidade biológica.Mas que podia haver um outro contexto nisso.E qual seria ele?
     Aquele em que sentissem que o âmago de sua alma estava integrado com aquilo, com o fazer e o viver artístico, a ponto de sentir que sua vida perderia sentido sem essa coisa; aí estariam entrando num terreno perigoso e fascinante, quase um caminho sem volta, com o risco futuro da maior sensação de fracasso que se pode imaginar em caso de frustração de objetivos, sem criar expectativas de sucesso, glória ou fortuna, já que tudo é envolvido em acaso e indefinição.Porque mais importante que tudo seria a sensação de criação, essa forma de matar a morte, como dizia Romain Rolland.O salto no escuro e na incerteza, naquele momento de leão que vale mais que a existência toda de um cordeiro.O risco da marginalidade, da não aceitação e de inúmeras privações.E frustração com as próprias limitações, algo nada fácil.Mesmo sem sofrimento material, a alma sempre insatisfeita, a insatisfação constante com o que se faz.Picasso que o dissesse....
A percepção de que até mais importante do que o viver seria o criar .E tudo que fosse o viver, fosse companheiro, amante, família ou  amizades, tudo existiria para alimentar o criar. Não pode haver meio expediente para isso, se o negócio se torna muito sério.Ou seja: quase uma “missão” voluntariamente aceita numa encruzilhada da vida.
Bem, tudo isso era perfeito para perder muitos alunos.Ficavam apenas os missionários....Que, em geral, precisavam pouco de meus serviços já que, como missionários, já tinham dentro de si uma luz para guiá-los.

Então, claro!, percebi que já contava com pouca vontade de dar aula.Porque o que se faz sem paixão ou sem entrega total é atividade comum, está longe da vontade de certos temperamentos que nunca encontram bem seu lugar nesse mundo.E que lutam para manter vivos seus desejos e sonhos.Sem desejo ou sonho, sobra apenas o sono...da morte.

quarta-feira, 1 de março de 2017

Pessimismo contra otimismo

"o pessimismo do pensamento nunca deveria abalar o otimismo da vontade".Esse é um pensamento do grande escritor francês Romain Rolland, pensamento citado por Gramsci, quando esse mofava nos cárceres fascistas de Mussolini, também utilizado por Freud em sua obra famosa, A civilização e seus descontentes.Freud que, por sinal, mantinha correspondência com o francês; além de fazer o mesmo com meio mundo de intelectuais pelo mundo afora, claro.Daí que essa forma de enfatizar o papel da vontade nos remete ao papel da esperança.Realmente, esta é a última que morre. Nas necrópoles a inexistência de esperança coabita bem com o silêncio de pássaros ou discreto farfalhar sombrio em meio aos ciprestes.Nos hospitais, a esperança é sempre uma transpiração dolorosa em meio aos gemidos.Sem algum tipo de esperança já estamos, de certa forma, mortos.Quem sabe surja daí tanto interesse por temáticas de zumbis em seriados e filmes.Esperança não se obtém por crediário, constrói-se pela vontade; talvez pela teimosia.A zumbilândia tecnológica prescinde de esperança, porque toda esperança é alguma percepção ou deliberação(ainda que meio inconsciente e sem motivos concretos formais) de nossa individualidade, uma maneira de afirmar a vida contra a morte, essas duas tensões que habitam nosso interior, nosso cotidiano, nossas ações, quiçá o mundo louco que nos cerca, muito maior que nossa insignificância frente ao acaso, esse grande manto que o universo lança sobre nossa existência. Mas somos tão manipulados por fora(pela imposição dos valores sociais, culturais e econômicos) como por dentro(por forças irracionais que parecem mesmo agir sem nosso consentimento), que nos perdemos de nossa capacidade, muitas vezes, de assumir uma rota nas encruzilhados com as quais nos defrontamos.Talvez seja essa esperança um tipo de fé que prescinda de entidade superlativa que nos alivie do peso de nossa inescrutável condição de solidão.Sorte têm os que se estribam em alguma fé religiosa ou metafísica.Ou azar, dependendo do enfoque. Por mim, só me fio nos mistérios que dia a dia, mais o tempo passando, menos respostas apresentam.Pouco nos custa alimentar o pessimismo; instrumentos lógicos não nos faltam para erigir sua morada em nossos corações.Somente o mistério da vontade dá sentido ao todo sem sentido que chamamos de vida.E assim , a gente vai levando, levando.Inclusive por aqui, nesse país, cuja história por vezes me lembra um coveiro soterrando todas as esperanças que procurei cultivar nos jardins de meus desconsolos.