quarta-feira, 26 de junho de 2013

Momento político, eu e os outros

Não adianta mesmo: no final, em política, age-se mais com emoção do que com argumentos.A não ser quem direciona as coisas; esse tem que pensar bastante senão comete erro facilmente, incorrigível.
    Política, emoção, o individual misturado ao todo coletivo que nos envolve.Paixão.Como sempre, como toda paixão , pode nos levar a um abismo.O personagem do filme de Glauber Rocha dizendo  que "política e poesia são demais para um só homem"; a reflexão de Fernando Pessoa de que os políticos, assim como  empresários ou militares, são homens de ação, de exterioridade, artistas e pensadores, de interioridade, de reflexão.As velhas cobranças que me açoitavam a juventude e me fizeram dispender tanto tempo e esforço em pregações e jornadas políticas.Mas o homem é um animal político, diria Aristóteles; como fugir da ação?
     Nossa subjetividade existe em meio à materialidade objetiva que nos circunda, não podemos viver apenar a partir de nossa individualidade.Uma reação idealista, egoísta contra o ritmo e a dinâmica das massas?O mundo tão vasto e confuso, a humanidade sempre em lutas e brigas, a própria vida sendo uma labuta que carece de sentido e é plena de absurdos.
      Quando mais novo, lá pelos vinte anos que não voltam mesmo,  depois de minha paixão pela ciência,duas paixões outras me assaltavam: poesia e política; arte veio depois.Achava até que o mundo iria se transformar radicalmente e que eu teria que me preparar, tinha um papel político a desempenhar na sociedade e na história.Leitura, leitura,leitura....O mundo e os modelos de pensamento tentando enquadrar as coisas.Quanta adrenalina, quanta disposição!
     Ah , que não consigo ficar parado, o senso de revolta sempre acicata meus ânimos e vísceras.Ainda não me adaptei bem à vida, nem sei se o conseguirei até  minha morte, hoje mais próxima e palpável do que quando vivia a intumescência juvenil da prática social.Bem, pelo menos estou vivo.Sentir solidariedade pelo outro ou por uma causa, mesmo uma causa meio estranha, nos faz sentir mais vivos.Parado para quê? Criamos castelos de cristais, cheios de ceticismo extremado e conformismo; não são de cristais e sim de papel,apodrecendo com os ares da realidade.Com o tempo, as experiências vão nos torporizando e vamos perdendo encanto por tanta coisa: pelo amor, pela profissão e, mais facilmente até, pela ação política.Não adianta: o retorno da consciência reprimida age da mesma forma que o impulso reprimido, está sempre prestes a se mostrar.Derrota pela vida?Talvez.Pelo sonho?Nunca. Pode ser que acalentar sonhos coletivos esteja ligado a desenvolver outros, nossos e subjetivos, que já havíamos colocado de lado.Somos esperança em ação, desesperança em inação; assim é a dinâmica dessa máquina desejante do homem, engrenagem sutil e autônoma na grande máquina do mundo.Ainda que todos sejamos vítimas do acaso.Até uma mobilização, um evento histórico crucial pode começar com o acaso.
      O negócio é brigar.Nesses tempos, mesmo prezando a argumentação, tenho discutido com muita gente, por pouco resvalando na ofensa.Coisas da vida.Sério?Em parte sim, em parte não; mas visões de mundo antagônicas expressam resoluções de máquinas desejantes diferentes.Como vivemos em contatos de superficialidade, exceto quando esses são sexuais -ainda que se tente minimizá-los: são mais profundos do que aparecem por exporem uma "nudez" absoluta do ser humano -, quando um assunto mais passional entra na jogada, o clima pode ferver e podemos ver um pouco mais da interioridade do outro com que convivemos, superficialmente, apenas na camada externa e coloquial das convenções.Surpresa!"Você pensa assim?Que horror!".
     Mas é sempre bom ver além da superfície das conversas miúdas do lugar comum e do dia a dia mofado, ver a interioridade, nossa e dos outros, as visões de mundo que se explicitam em momentos de agitação e discussão.
     Nosso corpo nos dá sempre problemas, o mundo exterior é hostil e a natureza não foi construída para nossa comodidade; afinal, fomos expulsos do éden.Problema maior parece ser o sofrimento que os outros nos causam, as decepções e surpresas desagradáveis com esses outros, o contato com os outros que nos fere mas é inevitável.Existe sempre esse sofrer que é inerente à vida.Afinal, como não sofrer se nossos desejos sempre serão maiores que a possibilidade de sua realização.E as pessoas nunca são, de fato, o que imaginamos delas, muito ao contrário, de certa forma.Projetamos nos outros o nosso desejo de que esses outros sejam como queremos.Vasto, ledo engano.Mas sempre devemos insistir com esses outros.Para nos bastarmos, em nosso próprio jardim cultivado, temos que ser outros dentro de nós mesmos.O que não nos basta.Nada nos basta e pronto.Sempre haverá o eu e os outros.Isso só acaba com a morte.Precisamos dos outros, ainda que esses outros sejam criados pela nossa vontade de outros impossíveis por não serem outros além dos outros comuns que nos cercam.E sofremos com isso.Sem problema: há sempre prazer na luta, qualquer que seja, mesmo inglória.Destino humano.
     Como diria Camus, é preciso imaginar Sísifo descobrindo alegria e esperança em sua tarefa inglória de, eternamente, empurrar a mesma rocha montanha acima.

Nenhum comentário:

Postar um comentário