domingo, 29 de maio de 2011

pensamento noturno 28 de maio 2011

Sábado, erraticamente vagando vagabundo pelas ruas da cidade ,atravessada por um cortante frio de inverno, sei lá se esse frio vem de fora ou de dentro; escapa mais uma aura de frio que me envolve mais que o gelo de fora.Pensar solitário, ao longo das calçadas burburizadas  pelos gritos e desatinos causados pelo álcool, para dentro de mim procurando aquilo que, cá do lado de fora, se torna insuficiente para a necessidade do sentir.Na multidão de abstrações, acabo por mergulhar no oceano desses sonhos impossíveis que surgem nesses passeios em que somos restringidos pelas possibilidades do real, enquanto o irreal se espraia ao longo do caminho, como esse vento frio que parece um pouco alter-ego do lamento que a alma derrama.Porque amanhã só restarão os sonhos possíveis e eu, sombra do sonho que foi feito e desmanchado nesse passeio noturno, serei apenas o prolongamento de um” poderia”, mais do que verbo, substância impalpável do que o humano é.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

complicações amorosas de um fulano de meia idade

Ora, vejam se esta historia não se presta bem a um roteiro de cinema:

O personagem em questão é um homem, entrando na meia idade, profundamente desiludido com as relações humanas, principalmente por ter uma índole romântica que sempre o colocou em indisposições várias com o mundo.Dizem que, hoje em dia, marca-se data para se deixar de ser radical ou contestador.Ou seja: maturidade virou sinônimo de conformismo.Nosso personagem não engole muito isso, pois acha que essa postura leva a um acomodamento que resulta em algum tipo de mediocridade.Mas, enfim, românticos são sempre meio desfocados das coisas e dos fatos.Houve até quem dissesse que o ser amoroso(no sentido mais amplo do termo) e o poeta são inimigos da produção e do lucro.Parece haver tempo determinado para o romantismo.Depois a pessoa precisa ser séria(!).Sério?!
     Nem precisamos dizer que nosso personagem é artista e, como todo romântico, investiu mais no espírito que no negócio da arte e, logicamente, se ferrou...no bolso.Coisas de nossa dimensão material.
    Chegara à conclusão, depois de muitos relacionamentos e inúmeras frustrações(alguém já viu um romântico sem muitas frustrações?) que o mundo do amor cerrara de vez portas para ele, agora que as luzes da maturidade já clareavam os arroubos da juventude.Mas nada podemos fazer quando ainda somos  habitados por demônios da juventude.Tinha que ser mais madura na forma de agir, mesmo num mundo infantilizado como o nosso.O grande problema que via, no entanto , é que muitos companheiros seus haviam pulado etapas e tinham apodrecido de vez.Mais fácil manter íntegro o corpo do que a alma ou o coração...Pensava que o mundo da contemplação e das idéias resolveria tudo.Quem sabe nem precisasse mais de sexo, já que a contemplação plástica feminina era sempre algo renovável e surpreendente.Isso tudo depois de um relacionamento razoavelmente fraternal e suficiente dentro dos padrões normais de relacionamento: companhia, sexo, programas, um pouco de amor mas...sem paixão.Sem dúvida com prazo de validade determinado que, neste caso, conseguiu se prolongar por alguns anos, já que nosso personagem não via lá muito interesse em exercer as tendências poligâmicas da maior parte dos machos da espécie.Certos acomodamentos podem resolver problemas da carne.Mas relacionamento sem projeto em geral dura pouco, já que o mundo de hoje prescinde da indissolubilidade do casamento.Mas a única coisa que consegue manter um casal unido é alguma forma de interesse comum, nem que seja apenas a continuidade e manutenção da espécie, o mais básico de todos.Afinal, casamentos são sistemas de acomodação de afetos, necessidades, desejos, economias e procriação, se for possível.Pode ter amor, pode se criar amor.Mas amor, em si mesmo, prescinde da instituição, seja legal ou não.
     Perdido na boemia, nosso personagem começa a ouvir mais as pessoas.Hoje em dia ouvir historias, dramas ou conflitos é atividade profissional.Quem não quer um bom ouvido de graça?É só dar trela e o negócio vem.E ouvir mais as mulheres, inclusive, já que está mais interessado nisso, naquele momento, do que em comê-las.Nem mesmo se dava ao trabalho de estabelecer  fiado, o que demonstra uma certa alteração de sentir e perceber as coisas, por parte de nosso personagem. que o coloca em indisposição com o senso comum masculino que prega uma postura onde a mulher se transforma num ser invisível, materializado apenas pela imposição do desejo masculino.Claro, outros homens não podiam saber disso senão ele seria chamado de brocha, já que não é psicoterapeuta nem homossexual.Para os homens tudo é mais fácil pois, afora idealistas ou artistas ou românticos, esse assunto de amor é mais simples do que dizem as mulheres, segundo a maioria dos sapiens masculinos:poder, dinheiro, sexo, tesão, ódio e uma adequada dose de desprezo, para manter aceso o masoquismo feminino.O problema é que ninguém os tinham avisado de que as mulheres começavam a compartilhar dessa objetividade, já que elas devem ser mais realistas por uma certa imposição biológica ancestral.Nosso personagem, como todos seus companheiros de sexo, está numa sinuca de bico histórico, cultural, social e sexual.Mas é um romântico.E, como romântico, não escapará das teias do eterno feminino e seus meandros de maciez e paz prometidas, tal como canto de sereia tentando enfeitiçar a  Ulisses.Mas Ulisses era um realista e não um romântico.Aliás como haver romantismo na Grécia antiga, onde a mulher era tratada um pouco melhor que um cachorro?Contudo, houve  Tróia...
    Saiamos dessa aridez semi-ensaística e voltemos a essa espécie de reencarnação do personagem central do Lobo da Estepe de H.Hesse(aquele que não queria saber das futilidades do mundo comum e muito menos da superficialidade feminina, embora soubesse das profundidades envolvidas no sexo) em que nosso personagem estava se transformando. Sabem como é:às vezes a vida imita a arte.Muita literatura pode instalar toxinas na alma.Muita música romântica, poesia romântica, muita patologia e morbidez romântica.Como entraria a brutalidade da carne nisso tudo, o poder dos infalíveis instintos que nos espreitam a todo instante?Ainda mais em nosso mundo de vulgarização sexual, tanta carne feminina oferecida por aí, um desrespeito aos próprios sentidos seletivos, sexo fácil, pouco compromisso e muito pouca coragem para se envolver ou firmar pacto afetivo, logo amoroso?Grande problema, ainda mais para um chato e idealista amoroso.Dizia a si mesmo: um homem independente é um homem que é independente das mulheres, do miasma do mundo feminino e de sua fluidez desconexa, sem sentido ou profundidade.Nada mais lamentável que o sedutor contumaz, o comedor, esse sim o mais dependente das mulheres, pois sua vida não tem sentido se sua virilidade(a básica, não a da alma)não for confirmada frequentemente.Uma postura mais adequada para uma situação de excesso de hormônios.Na meia idade, nosso personagem já via muitas vantagens nesse iniciar de fenecimento testosterônico que provavelmente já devia acometê-lo.Ah, a ansiedade juvenil...Todavia, acrescente-se que nosso personagem não foi um jovem muito padrão.Não se esqueça:sempre fora um romântico, desde a mais tenra idade.Talvez até tivesse um gene romântico, vai lá saber.E, como todo romântico, não aprendia direito as regras do estranho xadrez que as mulheres jogam.Nunca saíra da fase do dominó, como quase todos os homens, menos os sem caráter.
     Mas romântico que é romântico nunca perde a pose nem o conceito.Conceito romântico que faz de si mesmo.Nisso torna-se um fascínio e um problema, para si próprio, para os outros e até mesmo para as mulheres e sua inevitável praticidade.O romântico nunca se livra do território dos sonhos e de sua ânsia de expressividade natural.Isso se realmente for um romântico e não um “emocionalista” vulgar, essa farsa de romântico do mundo comum .Porque, para o romântico autêntico, se a coisa é preta aí é que ele encana mesmo.Aquela busca do desejo que não se satisfaz, tem quase que por sentido se prolongar.E tome sofrimento nisso.Nas mulheres produz frequentemente aquela melancolia de Maria Madalena perdida em sua auto-expiação.Nos homens, não raro, a patetice que fazia a humor dos deuses.Para alguns até mesmo a loucura.O romântico nunca pode ser um “comedor”.Só pode ficar preso ao eterno feminino e não ser dependente das mulheres como o “comedor”.E tem que sofrer muito, incauto estulto, nas mãos de mulheres, um masoquista sombrio.Só se tira alguma coisa de útil disso tudo se virar arte.De resto é caso de sanatório psiquiátrico.Porque só mesmo a arte, no frigir dos ovos, é o que fica.
     Resolvera então nosso personagem sair desse charco emocional e filosófico.Bastava!Sejamos práticos, dizia a si mesmo.Então o caminho era o ceticismo e o ascetismo.Só sofremos se nos submetemos aos nossos desejos, não é mesmo?Pronto.Equação resolvida.Viver era querer.Querer era sofrer.Logo viver era sofrer.Sem querer não há sofrer sem que, contudo, deixemos de viver, porque a vida é mais forte que tudo e age por cima de nossa vontade, queiram ou não todos os idealistas filosóficos do mundo.Mas se o motor da vida é o amor, o gênio da espécie manipulando homens em falsas livre-escolhas que objetivam uma espécie de aprimoramento do que se é na própria vida, então a equação não se fecha.Nem se abre.Um idealismo acaba matando o outro.
    Essas mirabolices teóricas infestavam a mente de nosso personagem, no intuito  de afastá-lo das demoníacas plasticidades carnais femininas, obsequiosamente expostas em seu cotidiano.Afinal, nosso personagem não podia ficar trancado o tempo todo em casa.Ninguém é de ferro.Mas para as mulheres, dizia ele orgulhoso, seria de titânio!Pobre personagem!Esqueceram de avisá-lo que  cinza é a teoria, verde é a árvore da vida.Tudo isso desaba por terra sob a graça de um simples olhar.Afinal, nosso personagem nada mais era que ....humano.E, como qualquer humano, nunca estava preparado nem para a velhice, nem para a morte, nem para o amor.No caso dele, para uma conjuminação fatal entre um nascimento de um amor e um renascer de um amor antigo.Num prazo curto de tempo.Céus!Sobreviveria ele a essa hecatombe sinistra do coração?Quem está preparado para os mistérios do coração ou para amar uma mulher?E quem está preparado para amar duas mulheres ao mesmo tempo?Seria possível?A pergunta adequada:seria suportável?Já vejo os deuses se debruçando sobre as amuradas do Olimpo e se divertindo com nosso marionete de carne.O eterno feminino capturaria a presunção masculina.
O palco estava montado.
     Na rua passeia nosso personagem em noites frias de solidão.O tempo voou rápido e ele não pode mais agir como criança.Mesmo vivendo num mundo infantilizado como o nosso.Em cada passo uma busca de certa placidez da alma.Onde mulher entrava nisso: precisaríamos dela para nos livrar do inferno e também para nos infernizar.Nosso personagem caiu mais na capetice em seu passado, optando pela servidão voluntária aos rigores do inferno.Exceto algumas, suas ex-mulheres tinham, redundância, parte com o demônio.Também, qual mulher que não tem?Ou qual homem que não quer?Se só houvesse tédio no paraíso, não estaríamos aqui.A maçã foi o alucinógeno da época.
     Nosso personagem estava convicto que, seguindo o espírito da época, não corria risco de se apaixonar ou sofrer das velhas mazelas do amor.



    Coração secando, mas grávido de todos os sonhos de... amor.Não esqueçamos da patologia romântica do infeliz.Ah, a arte, a arte...Ah, mas o dinheiro, o dinheiro...Talvez fosse melhor na época dos cavaleiros andantes.Patético, não?A alma pura contra a vulgaridade do mundo moderno.Chato, não?
    E nosso personagem pensava, pensava.Como pensam esses românticos!Deviam se alimentar do sol ou, melhor, da luz da lua.Esse tipo de gente é meio perigosa para a sociedade.Se a moda se espalha a máquina para.O sonho, a arte, a arte...o dinheiro, o dinheiro.E o amor.Ôpa!Amor?Sem discussão!Nosso personagem estava atrás do Eros transcendente, o criador da vida e  de cidades,o desejo que não se satisfaz e apenas se prolonga, para elevar a alma do corpo e suas limitações sensíveis, a um estágio  de pureza e ordem ideal, digna de Platão nenhum botar defeito.Onde entra o cartão de crédito nisso tudo são outros quinhentos.
     O problema era o choque “entre a alma pura e o caos sangrento” da vida, como dizia um poeta. Diabos!Tinha que ser um poeta para dizer isso!
     As quatro virtudes: coragem, sagacidade, compaixão e solidão. Haja saco para exercê-las!Sonhador não muito jovem soa meio ridículo, não?Preservar a sanidade em meio à insanidade preponderante. Mas e se essa insanidade é que mantivesse a máquina do mundo funcionando?
    Crente de que o amor não passava de uma farsa cultural, onde ele inclusive embarcara, possessão dos instintos de acordo com os interesses da mãe natureza e de sua vassala mor, a mulher, considerou-se invulnerável, embora  triste.Como a saudade de algo que não se viveu, ou da posse de algo que nunca se teve.Mas já sofrera muito por amor.Bastava!A razão alimentaria o corvo que diria: nevermore!A coruja de minerva não seria empalhada. Eros satisfeito, a morte triunfante?Nem mesmo Dr.Freud tinha a solução. Quem tinha?Fruir sem desejar. Mas como?Talvez se alienando de si mesmo. E a consciência da morte lembrando da efemeridade de tudo, quantos conhecidos já estando nos mundos sem resposta. O amor como resposta ao medo da morte?Talvez apenas uma crise de queda hormonal, vai saber...

   E o medo de saber que já não podia se dar ao luxo de ter medo por não ter nada a perder.Mas o amor, aquele que nos faz ridículos e diverte os deuses, esse não podia vir, em hipótese alguma.Só faltava essa, a essa altura da vida?Mas quem sabe o que acontece nos meandros do destino?As parcas têm um estranho senso de humor.QUEM  DOMINA O CORAÇÃO?
      Pobrezinho...Caiu.Pior: de novo.Pior: na idade dele seria um risco maior.Quisera agir nas emoções como na arte, seguindo os cânones clássicos.Mas românticos têm muitas dificuldades com o classicismo.Como ser clássico e romântico em matéria de amor por uma mulher?Na música, na pintura ou na poesia, sem problemas.Quando o negócio é amor, tudo se embaralha e as regras logo se transformam.Aquilo não se resolveria como arte, embora a arte também viesse do amor.Não seria um clássico.Quando muito seria um cubista.Mas não tinha jeito: sabia que descambaria logo num Van Gogh ou num expressionista abstrato.Necessitati datur vênia.Necessidade não tem lei.Ninguém é criador maior de necessidades do que o amor.Nenhuma necessidade é maior do que amor.Isso para românticos, claro!Esses subversivos da normalidade!Descobriu-se o pateta que era para si mesmo em sua mentira.Nem ioga, nem budismo, nem qualquer credo filosófico iriam ajudar.Nesses casos a única esperança é que o tempo corra logo.Mas o problema é que quando o amor surge o tempo para.
     Caiu, de cabeça: na ilusão, é claro.Como convém ...aos românticos, é claro.Sabe como é : o desejante acaba desejando mais o desejo que o próprio objeto de desejo.Uma forma elegante de maluquice.E a dor acaba por alimentar o desejo, como se presta bem a um romântico contumaz.
     Quem entende a cabeça de uma mulher?Quem entende a cabeça de duas mulheres?Quem entende a cabeça de duas mulheres...confusas?Entenderam?Bote aí um romântico idealista e está feita a mistura explosiva, detonando qualquer barreira de bom senso.
     Quando surge a necessidade de amar, dentro de alguém, muda-se todo discurso.Ou seja, o ser amoroso ressurgente(no caso de nosso personagem) vê em qualquer indício, pela paixão ou pela idéia, uma manifestação absoluta do destino, uma forma de fugir do vazio e da frieza de uma vida sem objetivos ou de cotidiano emocional árido.Tudo pode virar uma tábua de salvação, a última esperança em vida.Isso para qualquer normal.Para um idealista romântico isso pode significar uma salvação do próprio sistema solar(que, por sinal, já é condenado) ou do próprio universo.
     Foi aí onde começou o périplo de incertezas de nosso trouxa, digo, personagem.


     Roteiro: duas mulheres mais jovens,uma dezessete e outra vinte e cinco anos menos que o infeliz personagem.A primeira um ex-relacionamento de cinco anos, desfeito há pouco mais de quatro.A segunda uma companhia de alguns encontros, uma grande empatia relevada e revelada , uma investida que sempre foi encarada com relutância, por ele.Não era tanto a juventude quanto a excentricidade dela que o cativava, embora o ditado diga que o leão velho aprecia mais a carne fresca.É claro, contavam algumas particularidades especiais da moça: por exemplo a tendência a baixar uma pomba-gira sob o efeito do álcool.Nada incomum: já vira muitas mulheres que enlouqueciam sob o efeito do C2H5OH.A primeira vez que a viu estava embriagada e dando em cima de todos os homens do bar.Como não embarcar numa fantasia encarnada numa mulher como esta?Não esqueçam: românticos adoram desregramentos.Sóbria já não era a mesma coisa, embora mantivesse a beleza, mas bem mais pueril e inocente.Ah, as perdições que se ocultam na alma feminina...
     Maldades fora, a moça, aos seus olhos, era uma graça.Maluquinha, maluquinha.Mas a loucura é sedutora.Quem não sonha despencar num abismo de vez em quando?
      Sua ex, a de relacionamento de cinco anos,  foi revista por acaso.O fim do relacionamento entre os dois se deu de forma fria, embora realista do ponto de vista feminino.Sempre que a encontrara em outras ocasiões evitara de falar ou puxar conversa com ela.Havia ainda muita mágoa pela maneira com que ela desmanchara um relacionamento longo de cinco anos.Por achar que ele não queria casar ela desmanchara por telefone.Prático, sem dúvida.É que ele não tinha e-mail na época.





Um dia encontraram-se por acaso, numa madrugada em que todos se recolhiam.Ela o parou na rua.Ele hesitou.Pensou em dar desculpa e dar no pé.O que falar depois de quatro anos e uma desfeita daquela?Sentaram, conversaram e, para surpresa e alegria dele,
  percebeu, após o reencontro, que ainda... sentia amor por ela!Ou alguma coisa que lembrava amor.A necessidade de amor pode criar muitas ilusões.Revelação estranha, já que o fim do relacionamento tinha sido estúpido e desumano para ambas as partes, embora inexplicável(ou não?).No dia seguinte ficou perturbado, como se tivesse presenciado algo de misterioso e perigoso, na noite anterior.Falando com amigos, quase todos o incentivaram que a procurasse.Porque não apostar na possibilidade da felicidade...ou da tragédia.Botou na cabeça que ainda podia tentar voltar com ela.Sabe-se lá o que se passa na cabeça de uma mulher...E na dele também.
     Durante duas semanas ficou ensaiando uma forma de reencontro, algum tipo de reaproximação.Usou dos abomináveis e elípticos “torpedos” telefônicos.Respostas razoavelmente positivas.Ah, esperança, sangue que alimenta a alma e o vértice do coração adormecido!
     Mas eis que num certo dia, meio por acaso(essas coisas são sempre por acaso!), uma moça,nada mais nada menos que a maluquinha, por quem tinha muita simpatia, certa atração, um bocado de receio e pouca esperança, tendo saído algumas vezes com ela , lhe telefona.Saem.O passeio, como os demais,feitos ao longo de um período de muitos meses, fora muito agradável.Ah, o problema do olhar feminino!Ah, o problema de quem entrou na fase de se encantar com a juventude como alguém que encontra o prazer da primavera após o inverno.Além do mais, como não ter carinho pela única mulher que lhe mandara uma mensagem durante o último natal?
      Por  ser bem mais jovem não podia evitar de vê-la com um certo ar paternal.Mas era mulher.E, nos últimos tempos, afora as mais velhas que ele, não conseguia deixar de ter postura paternal com mulheres.Dizia: no fundo são todas umas crianças mimadas, algumas brincando com bonecas de carne e osso.Homem, entrando em meia idade, começa a ter ar mais paternal, mesmo que não tenha tido filhos.Embora sempre com leves impulsos incestuosos, querendo ou não.Afinal, ainda é homem.
     Não havia jeito.Já estava meio encantado pela moçoila.Na verdade, talvez já tivesse se encantado na primeira fez que a viu.Mistérios do coração.Mas tinha certeza de que seu bom senso evitaria qualquer precipitação que o jogaria, por medo, numa tremenda fria.Além do mais, havia o projeto de retomada com a ex.Por isso, quando a jovem o convidou para ir a seu apartamento, não teve receio.O homem titâneo sobreviveria!Resultado:noite de maravilha e encantamento com a moça.E ele nem ao menos havia bebido.Fundamental para exercer o controle.Que controle?Quem controla um coração encantado.Tudo conspirou para um inevitável desenrolar.Nenhum Parsifal  de pureza irrepreensível resistiria à situação.
    Pouco depois, agora não por acaso, envereda num curtíssimo romance de uma semana com a  jovem.Meio sem querer mas ao mesmo tempo querendo tudo.Mas que fazer, tudo conspirando.Fica apaixonado.Talvez já tivesse se apaixonado na noite em que a  viu embriagada.Um demônio em seu interior queria dialogar com o demônio dela.No final de semana, alma exultante e coração a mil, um novo homem em seu interior.A sua ex naquele momento voltara para o sarcófago do passado.Um mundo novo se abria para ele.No domingo, abominável torpedo(para ele esperançoso): há um e –mail para você.Entusiasmado imaginou coisas belas e foi para o computador, cheio de ansiedade.Abriu.Viu.Viu de novo.Releu.Releu de novo.Ela desfazia o relacionamento .Relacionamento rápido. Processo rápido: e-mail. Afinal ela dispunha de um instrumento não acessível para a  ex,há quatro anos.Fica estarrecido.Nem telefona para ela.Apenas responde : tudo bem, nada a fazer, eu queria algo sério, mas entendo as razões, seja feliz.Nosso personagem evita o rancor, foge do orgulho tosco e inferior.Afinal, ele é um idealista.Tem que se mostrar maduro.E como homem maduro faz o que deve fazer: chora muito a frustração.Já começa a computar o tempo que levará para essa paixão sumir.Pobres e tolas pretensões da razão.

     Furiosamente ele usa o processo analógico da carta escrita, via correio, onde diz o que sente e confessa sua paixão e desespero.Pronto.Mecanismo acionado.Daí não tem volta.Tem vontade de morrer.De ir para Marte ou Pólo Norte para enfrentar ursos polares.Não há alguma guerra disponível que aceite voluntários?Ela responde, não analogicamente, em carta(via mensagem por celular, sinal dos tempos) questões de diferença de idade e medo de ter que enfrentar problemas com isso.Será?Sabe-se lá o que se passa na cabeça de uma mulher insegura e confusa como ela.O infeliz fica desesperado, usado, abusado, etc e tal.Crise total de melancolia e abandono.Cartas, mensagens, silêncio e dor.Nada a fazer.Mais uma vez enlaçara-se em sua própria teia de ilusões.Ela ligara o start e dera no pé.Dizia um moralista francês  que quando se ama uma mulher é quando se está mais próximo de odiá-la.Provavelmente isso tinha a ver com o amor paixão.Como todo romântico e artista não podia deixar de estetizar o que sentia.Cartas e cartas e poemas, a maioria de qualidade duvidosa já que eram mais regidos por Dionísio que por Apolo.E quando os dois não andam juntos o resultado não costuma ser bom.Claro, procurava racionalizar em vão sua paixão.Era sexo, apenas sexo.Seria?Uma oxigenação concentrada alimentando a libido indolente?Hummm.Quem sabe?Seria?O problema era a sensação de estranha beleza que envolvia isso tudo.Quando não se sente ternura é mais fácil.Esse era o problema.Quanto tempo duraria, o que restaria disso?Dormir e acordar com a lembrança dela e tudo o que se referia a ela.O que sentiria ela?Projeta-se idealisticamente, principalmente quando se é assaltado pelo romantismo, no outro o que sentimos em nós mesmos.A paixão sempre é afirmação de um ego tendente ao totalitarismo.Nesse caso o amoroso e passional tende a extinguir-se por si mesmo.No fundo, essa patologia disfarçada gostaria de virar Tristão e Isolda, acordes wagnerianos envolvendo em púrpura sombrio esse espetáculo de patetismo outonal de nosso personagem.O passional vira um chato obsessivo.Quem agüenta o cidadão num caso como esse?Pior era agüentar suas teorias psicologizantes que tentavam, mania de nosso personagem, explicar o porque daquela ruptura.Haja, para seus conhecidos e seu espelho!
     Um mês de tortura.Tem que fazer algo.Tem que botar outra mulher no lugar desta.Solução que seria sensata e lógica desde que fosse a mulher certa.Mas o que seria essa mulher certa.Nosso romântico precisa de dificuldades abissais.Eureca!A reconquista da ex perdida.Mal sonhava ele como esta já estava perdida, inclusive para ele.

    Para salvar o dia, para não dizer a alma, vai atrás dessa ex, com quem já teve planos matrimoniais no passado , meio vacilantes mas concretos.Porque não reavivá-los de novo.Com o tempo a paixão pela outra seria submersa por motivos superiores de um relacionamento entre um homem e uma mulher.Sim:casar e levar uma vida tranqüila.Por que o casamento seria um grilhão para o espírito, um lastro para a imaginação de um artista?Não era mesmo boêmio e não tinha aquele fascínio de cotidianidade pela noite.Um pouco de aburguesamento não lhe faria mal.Estava maduro.Mais um pouco e apodrecia.A tábua de salvação!Se  livraria daquela paixão infernal.Aquilo tinha sido apenas o furor da carne e abstinência.Mas seria mesmo?Só o tempo diria.Mas urgia retomar o projeto casório.


Com a dor da perda da primeira na cabeça iria atrás da segunda.Velha fórmula masculina.A velha máxima: o tempo resolve tudo.Além do mais,dizia, a mais jovem    era muito mais jovem, só iria dar problema, seria ridículo,ficaria enjoado(como se todos os homens, em algum momento, não enjoassem de todas as mulheres...), uma floresta de preconceitos e lugar comum de todos os lados, o direcionando na busca da outra, aposta mais correta segundo o bom senso(?)  dos amigos da onça de plantão.A mais nova era maluquinha, confusa, imatura(como a maioria de todas as mulheres, diria nosso personagem).Mas o infeliz está perdidamente apaixonado por ela.Que fazer?Obviamente não seria Lênin que teria a resposta.
        Meio desenxabido e quase sem esperança, tenta contato com a ex, após um mês de sofrimento, cartas e mensagens sem resposta,por causa da paixão guilhotinada.Mas a ex reluta em manter contato.Nosso romântico, como bom idealista, cheio de conselhos ruins de outros bem intencionados, cisma que ela ainda o ama.Sim: simplesmente porque ele quer assim,ora bolas!
         Após uma carta, consegue, após longa negociação(afinal, ela é advogada), um encontro , coisa que o deixa exultante e pleno de esperanças.A outra, momentaneamente, em algum escaninho do coração.O tempo.O tempo.
     Grande roubada!A segunda,a ex que tanto sofrimento lhe infligira com a separação telefônica, é recém-separada, está confusa e de auto-estima baixa.Mas pensando bem, para ela, não seria má idéia ser cortejada por um ex-namorado.Dá mensagens dúbias e, por acidente, constata o nosso personagem, num flagrante imprevisto, que ela ainda mantem  algum tipo de relacionamento com o ex.Ela diz ao nosso personagem que não quer voltar com ele, embora num dia ela  lhe telefone para perguntar como está.Conclui: em quatro anos nunca me ligou.Isto seria um bom sinal.Já estamos no estágio de delírio, quando a pessoa começa a acreditar naquilo em que ela precisa acreditar, sem ter correlato com a natureza.Os amigos da onça de sempre lhe dizem que mulher que não tem interesse algum não liga mais.Infelizmente esqueceram-se do narcisismo feminino.Afinal, é sempre bom ter algum na cola, mesmo que não se goste mais dele.Durma-se com um barulho desses.O cidadão fica perdido, age romanticamente(como não fazê-lo, logo ele), faz cena de ciúmes, manda cartas,flores na madrugada,  declarações,toda cartilha de corte, resolve até pedi-la em casamento, vai no cartório e vê documentos, pede para a mãe consentimento para casar com a filha, o escambau e o diabo a quatro.Sente que ainda gosta dela. Quer pelo menos acreditar que ainda gosta dela e, pelos poderes imaginários romanescos do destino, ela ainda gosta dele,que
poderia encarar o casamento sem problemas.Combina com ela, por telefone, que quer declarar pessoalmente o que sente e suas intenções.Tem um problema, contudo, durante as mensagens para não confundir nomes e invocar o nome da outra sem querer.Numa ocasião, quase faz isso.Quase manda um torpedo errado, coisa que produziria um naufrágio imprevisto.
     Diz , então, que  ela marque o dia.Os dias passam, o tempo passa, o vento passa, as folhas tombam e nada de contato.Conclui que seu silêncio já era resposta.Resignado fica num ostracismo de silêncio interior.Já perdeu uma.Porque não perder a outra.Numa festa, por acaso,  encontra a ex e ela age como se nada de sério tivesse havido nesse tempo, como se nada de sério ele tivesse para falar, apesar do dito em cartas e   por fone.Uma amiga o incentiva a chegar num canto, puxar conversa e falar sobre o assunto.Mas olha num canto escuro da sala e vê a sombra de sua paixão.Hesita, para.Não falará nada!Sem contar que já se declarara na casa dela, até mesmo assumindo a culpa pelo não casório no passado(uma injustiça contra a verdade).Diriam alguns que declarava para uma o que desejava declarar para a outra.Fez isso sem saber.Cabeça em alvoroço, o sentimento amoroso, como um diabo autônomo, agindo como um fecho furioso de elétrons bombardeando seu coração como um mísero núcleo de hidrogênio.Uma lua infernalmente prateada no céu , a lhe dizer que seu destino em verdade não lhe pertencia.Ele pertencia apenas aos demônios que foram despertados em seu interior.Anjos e demônios lutando por nossa alma, roubando nossa paz, as esperança de felicidade cegando a razão.

     Duas perdas, dois sonhos desfeitos em pouco mais de dois meses!Ou um sonho e o sonho de se livrar do primeiro frustrado?Nesse tempo ficou com a cabeça em parafuso: apaixonado por uma e ainda sentindo amor pela ex.Ou pelo menos tentando acreditar que sim.Tentou ser racional, não conseguiu.Sonhos misturados.Sua vida parara.Não conseguia pensar em mais nada.A necessidade de amor, tentáculo invisível da natureza cegava o infeliz.Todos diziam:ele pirou de vez!Para ver se  tirava de vez as duas da cabeça, imaginou até bater com a cachola na parede.Pior:sentia-se culpado por ...amar duas mulheres de uma vez!Realmente, um crime extraordinário!Se fosse trair duas de uma vez, tudo bem, mas...Como se isso fosse um crime contra as leis morais ou éticas(mas há ética quando o assunto é amor?).Tentou odiar as duas, não conseguiu.Escreveu, escreveu, cartas imensas tratando-as como deusas ou divindades.Um mês para tentar esquecer uma, outro mês para tentar a reaproximação com a segunda.Reflexões sobre o amor, Barthes, Stendhal, poesia, poesia, poesia.E um monte de concertos românticos e dramáticos inundando suas madrugadas insones, enquanto escrevia os horríveis poemas comuns de um apaixonado, amoroso, confuso, perdido, obcecado.Muito conhaque e um monte de palpites desencontrados de todos.Parou seu fazer artístico.Só escrevia.Ora pensava numa, ora pensava noutra.A paixão pela mais nova era recente, doía muito na carne.Mas a ternura pela ex ainda era uma chama viva que aparecia como uma promessa de futuro.Tentava imaginar o que se passava na cabeça das duas.Conjecturas malucas.Ah, se pudesse ir a outro planeta...E ele nem ao menos sabe bem o que elas sentiam por ele.Elas eram muito fechadas e reticentes.Como podia perder-se tanto por duas moças tão imaturas, infantis, fechadas e quebradas por dentro?Pronto: seria o Lancelot  salvador da princesa perdida em sua própria solidão e fragilidade.Paternalismo tardio por duas crianças covardes:uma desmanchara por telefone e outra por e-mail.Isso dizia tudo.E sempre , o coitado, fora acusado de orgulhoso com as mulheres.Quisera saber ele o que fizera, o que ocorrera com seu orgulho com essas duas.Amor exige rendição incondicional.Durante o pedido(a tentativa de) já imaginava como deveria contar para a outra , sua recente paixão, que ia se casar.Mas a outra lhe dera o fora!O cidadão estava desalterado de vez.
       Resolve, então, apagar de seu coração a ex-pretendida-matrimonial,  a partir do comportamento confuso e covarde dela,apagar de sua vida ou de objetivos.Escreve carta onde diz que desistiu do pedido por achar que não ia dar certo,nem hoje nem há quatro anos atrás.Além do mais, fazer o pedido numa festa acabaria por gerar a idéia de que estava bêbado.Afirma não se sentir culpado, nem antes, nem agora e que , para ele, afirmava,
 textualmente, que desistia dela de vez.E sabia,  pessoalmente, olhando para o fundo do coração, que seria de vez mesmo.Fizera o certo:tentara.Ficaria surpreso ao sentir que, depois de entregar a carta, se sentia livre.Em poucos dias a imagem da ex sumia.Na verdade, já desaparecera há quatro anos.Não passara de uma exumação de cadáver, espécie de transferência para uma jazigo permanente na memória.
      Ainda apaixonado por uma outra que o largara um pouco antes.Ela que encerrara qualquer forma de contato por mais de dois meses, uma semana antes da festa decisiva do encontro ocasional com a ex,  encontrara-se com ele.Nosso personagem sentiu o óbvio: era apaixonado por ela, sentia muito amor e carinho por ela, estava ainda louco por ela(coisas de homem rejeitado, é claro).Fez declarações despojadas, segurando suas mãos e olhando para seus olhos,banhados pelo crepúsculo envolvido em néon num café.O pior é que suas palavras eram de absurda sinceridade.Ela é sincera também, ao lhe contar que estava com novo namorado.Mas já tivera caso com outros dois.Em dois meses?!E ele se preservando em sua pureza de vestal romântica.Sentira-se por dentro traidor por ter procurado a ex para um projeto inevitavelmente matrimonial, embora, no fundo, ainda estivesse mergulhado numa paixão de caráter quase juvenil.Sentia-se o mais ridículo e confunso dos homens.O pior idiota é o que se convence de que sua idiotice é ética ou sábia.Nada como um dia após o outro, uma facada após a outra.Tenta lhe dar um beijo.Ela evita.Oferece a face.Afinal, não bebera, estava controlada.Agiu convenientemente como uma adolescente cândida.Se ele agisse logicamente levantaria e iria embora, dizendo-se ofendido.
     Mas como botar lógica nisso.E isso depois de uma declaração de amor de nosso ignoto personagem. Algumas atitudes femininas fazem a s correntes de Prometeu parecerem de pelica.Resolvem os dois manter algum tipo de contato ou relacionamento, só Deus e a cabeça dela sabendo de que tipo.Que relacionamento, depois de uma ruptura por e-mail e nenhuma resposta, afora uma depois de  longa carta em que, meio em tom de despedida, ele lhe confessara tudo o que sentia e pensava dela?As mulheres não têm idéia de como um homem pode se abrir numa carta de amor.Ou numa declaração num café, quando sua vida tenta se refazer num sonho de felicidade ou num simples beijo roubado, porém sonegado.Afinal, o que escondia o sorriso dela?Talvez que ele virasse um conveniente estepe?Bem, vá lá.Que fazer?Antes alguma coisa que nenhuma coisa.Como sempre dizia: uma gota de amor tem o peso de um oceano.Nada mais a fazer do que se resignar.Mas e se o estepe esvaziasse?Se acontece no porta malas do carro...

      Como custava a ele acreditar em deus ou na sabedoria das mulheres, vira que aquilo era meio buraco  na água.Ou buraco no estepe, dava na mesma.Mas tinha que tentar.Ela o deixava exultante.Dois meses era pouco para matar uma paixão.E o que fazer se ao lado dela sentia-se feliz?E depois também.O que dissera não o fazia há décadas.Rejuvenescera uns vinte anos. Ele chegou até a contar que ia procurar a ex para tratar de uns assuntos.O pedido fora feito de forma indireta há mais de semana.Não acreditava que a ex lhe respondesse.Contava desde já com um não.Silêncio sem resposta.Por vezes o silêncio diz tudo.Na festa, esperando uma resposta da ex, ainda percebia uma espécie de fantasma da outra em sua mente.Podia até ser que voltasse com o ex.Seria?A indiferença dela parecia algo gritante.A ex voltando com o ex.Mas essa ex dizia que não voltava nem com ele ,personagem, nem  com o ex.Excelente!Em verdade, tinha certeza de que receberia um não.Na festa, ele ficara angustiado, pobre moralista monógamo, com a possibilidade de descartar qualquer tipo de relacionamento com a nova paixão, caso a ex aceitasse o pedido.Quanta bobagem!Quanta ilusão!A nova paixão já estava com outro, não era mesmo?A ex ainda se encontrava com o ex, não era mesmo?Já ouvia as risadas masculinas de seus conhecidos e amigos..E ele  ainda seria chamado de volúvel, imaturo(apesar da idade), sem noção e outras desqualificações mais.Só não contou uma coisa: no início de tudo, antes da paixão semanal ou do projeto matrimonial, ele não as procurou.ELE FOI PROCURADO POR ELAS.E ficou sem nenhuma delas.E sabe que, no fundo, nenhuma delas estava muito aí para ele.Mas romântico que é romântico sempre põe o carro na frente dos bois.Cai de vez no amor pelo desejo em si mesmo.Seu destino era quebrar a cara , esfacelar-se contra as rochas do cotidiano.Mergulhar na solidão sombria de um Lobo da Estepe?
     Lição final: homem romântico, se não for cafajeste está frito.Mas se deixar de ser romântico, acaba por violar sua própria natureza.Não há jeito mesmo.E se levar-se  a sério, enquanto romântico, pior ainda.Porque as duas mulheres amadas não eram invisíveis para ele .Sempre tivera profundo interesse pelo que passava dentro delas.Realmente era amor o que ele sentia pelas duas.De formas diferentes, é verdade.Mas o que importa?Porque a necessidade de amar fazia com que ele projetasse o sonho de amor além das evidências da realidade.O que quer que lhe falassem , ele acreditaria.Mas quem não teria o sonho de ser feliz com uma mulher?Esse foi seu crime.Quem entende o coração de um homem e quem entende o coração de uma mulher?O amor nasce para nos modificar ou nos modificamos através dele?Ele estava tentando enxergar além e se defrontou com esse estranho vazio que protege o cerne da alma de qualquer mulher.
      Em pouco mais de dois meses, nosso personagem ficou habilitado para uma temporada no hospício.Sabe-se lá para onde vai.Porque amar e perder duas mulheres de uma vez é demais para um só coração.Principalmente em tão pouco tempo.Podemos vê-lo andando na rua, de novo buscando na luz das estrelas esse Eros universal e transcendente que nos coloque mais próximo do que elas,estrelas, são.Silêncio.Vazio.É sempre assim.Seu coração, antes tão cheio de poesia e sonho, agora estava mais vazio que o vácuo que circunda aqueles astros.O amor delas, se houve, era como as estrelas, cuja luz nos atingia, mas elas não mais existiam.E as duas, quem sabe, como estrelas mortas, mergulhariam na escuridão do universo da memória.
        Só resta ao personagem olhar-se no espelho e dar risada.Por ter escapado de um tratamento psiquiátrico.Por ter escapado dessas duas roubadas...Ou quem sabe por concluir que ainda não estava morto como pensava.
     Com o tempo nosso personagem foi clareando mais suas idéias.Por ser romântico e homem, caíra no universo de duplas mensagens da subjetividade feminina.Transferira, sem dúvida, parte da paixão pela primeira para uma projeção ilusória na ex.Nada a ver.E tudo a ver, se observarmos o caráter de nosso personagem.Como se quisesse manter uma chama de amor acesa.
    Nunca saberia ao certo o que as duas sentiam por ele, pois nunca tivera uma mensagem explícita de nenhuma.”Travadas”, certamente é o que havia em comum entre elas.Embora a ex fosse morna demais para quem esperava uma resposta mais emocional pelo assédio por ele praticado.Mas até pode ser que a ex viesse a resolver seu problema com seu ex porque os homens, qualquer um sabe, para manterem sua territorialidade são capazes de fazer um sacrifício, como receber de volta uma mulher que foi rejeitada pelo próprio homem.E para ela, a ex, não seria má idéia reconstruir seu ego ferido pela rejeição, mesmo que para tal usasse do chamamento de um outro, já carta fora do baralho em seu coração, o otário da vez que era nosso personagem.A astúcia é sempre a arma do fraco...Mulheres, quando sentem ter um homem na sua mão, libertam um demônio oculto disfarçado em suavidade.Nada como ter alguém na condição de uma espécie de mosca de padaria:voa , voa  mas não deixam que ela pouse nos doces.Na famosa corrida de mesma direção e sentidos opostos que o amor é.A sensação de poder que se sente ao se ver alguém cujo coração está preso a nós.E os homens sempre  caem na s garras dessa fera de egocentrismo calculado.Velha máxima italiana: qui no estima è estimato.Alguns, pobres coitados, caem fundo demais.Dentre eles os românticos.Acusados por vezes de masoquismo.Mas se a dor faz parte da vida, como evitarmos de sofrer no amor ou na paixão?Quando Jacó enfrentou e lutou com o anjo enviado pelo Senhor, durante a noite inteira, após o fatigar do anjo que assumiu a vitória de Jacó, este lhe perguntou o nome e isto lhe foi negado.Mas Jacó saiu aleijado da luta.Não se enfrenta e se sai impune quando se luta com Deus, com os demônios ou o amor.
     Mas o grande problema de nosso personagem era o romantismo.Não é à toa que as filosofias e estéticas românticas surgiram como reação ao modo burguês e ao capitalismo.Porque românticos sempre são mal investidores, frequentemente jogam em fundos vazios, inclusive suas emoções.Altos investimentos para retornos duvidosos, esquecendo a praticidade e o moralismo escondido das mulheres, negligenciando os medos que fazem a “boa” conduta de todo mundo.O romantismo é inimigo da grande máquina do capital, é o avesso das posturas covardes que não encaram as grandes batalhas da alma, é sempre uma esperança de felicidade grande e não de satisfações mesquinhas que restringem homens e mulheres a um cotidiano de tédio e  fastio do espírito e da carne.Por ser romântico , sua sina seria a solidão.Nada a se desesperar, a morte sempre por perto e a consciência de uma tragicidade da impossibilidade amorosa.O capital amoroso estava sangrado.

    Quanto à maluquinha, em verdade a única paixão que atormentara de fato nosso personagem, ele não tinha  vaga idéia do que podia ocorrer.Tinha apenas certeza de sua natural inconfiabilidade .Teria apenas que esperar o tempo correr, até que sua lembrança se desfizesse por si própria.A mais renitente paixão pode virar indiferença com o tempo.O que não se constrói se desfaz como areia ao primeiro sopro de fraqueza ou covardia.O tempo varre como o vento, a areia cotidiana das horas secando as feridas abertas pelas ilusões e falsas expectativa.Expectativas, essa eterna maldição que ilumina de breu a razão de um romântico.Como evitar a frustração sem recorrer ao medo da fuga?Faz parte da vida.Levar-se a sério torna as coisas sérias.Mas gostar é sempre um caso sério, mesmo quando envolve piadas e situações ridículas como um clímax emocional sendo desfeito de frente a uma tela de computador ou por meio de um telefonema.Porque realmente a única coisa que existe para nós é o presente.E se levarmos a sério aquilo que não é sério, então somos um caso sério.Resta sempre a prerrogativa da dúvida ou da ilusão.Talvez a melhor forma de comunicação entre homem e mulher seja mesmo o silêncio.Afinal, o que  nos dizem as estrelas? Nada!Se dissessem algo  não seriam estrelas, mas  luz que não apenas ilumina mas vibra em nossos tímpanos.Mas nosso romântico teima em sonhar que as estrelas têm voz.A esperança será sempre uma estranha tatuagem em sua pele.Mas o Lobo da Estepe volta a rugir.Como voltar a adormecer o coração?As esperanças são como queimaduras que teimam em arder na pele, mesmo quando as lesões já foram cicatrizadas.Nosso romântico não consegue se desfazer de todos os cadeados de ilusões.Mais fortes são os poderes da vida que correm mais intensos que as pernas de nossas mentiras.Por não querer mentir nunca poderia fugir da espera.Lá fora, apenas o silêncio em meio aos ruídos do universo.A alma pura ainda se defrontando com o caos sangrento.
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segunda-feira, 23 de maio de 2011

dúvida, sempre dúvida, sempre duvidar...








     As pessoas são naturalmente desconfiadas frente a atitudes despojadas.Não é do nosso cotidiano conviver com a espontaneidade, exceto quando somos ativados por algum artificialismo químico.A máscara que carregamos é mutável de acordo com as circunstâncias ou conveniências de nossa sobrevivência.Com isso a desconfiança surge como mecanismo de resistência aos agentes externos atuando sobre nossos egos.O que chamamos de relações sociais é um emaranhado de interações de consciências.Essas, por sua vez, são condicionadas por impulsos represados pelos mecanismos  de controle social e civilizatório.É como se vivêssemos em uma peça sem direção e com roteiro indefinido, regido por um texto cheio de aleatoriedade.Viver não é apenas pensar para existir, desejar para se sentir presa da vontade, também  para existir.Viver é duvidar para existir, existir para duvidar.
     Sinceramente, fico em dúvida sobre tudo, não tanto pela minha capacidade de elaboração mental, mas sim pela grande capacidade de ilusão proporcionada pelos sentidos , iluminados pela surda luz dos hormônios animais.No fundo somos um amontoado de emoções mal conformadas, apenas amestradas.Toda emoção domesticada é emoção castrada.Por isso sempre me senti incomodado com a presença de animais domésticos, já que algo  de deformado ou deformante age na natureza íntima desses seres dependentes dos caprichos e mazelas do tão volátil temperamento humano.Tenho muita pena da dependência criada pelos animais.Nisso, o ar de desdém aristocrático dos gatos me fascina.Contudo, quem já não contemplou o horror da humilhação na cara de um animal ...ou de um ser humano?

sábado, 21 de maio de 2011

mulheres e praias

30 de abril
Sergio Marques
  • E eis que algumas mulheres são como praias que nós, náufragos nas águas do destino, contemplamos distantes, sabendo que lá não poderemos aportar, nem saborear o frescor das sombras de suas palmeiras, nem fincar os pés em suas areias de cristal ou nos refrescar na suavidade de alguma fonte misteriosa que venha de seu interior.Realidade ou miragem, quem sabe ilusão de quem se vê castigado pelo sol ardente do cotidiano, parecemos seguir ao sabor das correntes que não sabemos bem onde nos levarão.Tantas praias mas quantas serão portos?Nada importa pois continuamos nesse mar de águas turvas, olhando aquele sonho distante, aquela praia descortinada em beleza, quem sabe um paraíso de beleza impossível de receber pés indignos.Se algumas mulheres são como rios, outras são como praias que encastelam em suas margens esse misterioso sol que pode se esconder num sorriso.Quem não sonharia num repouso eterno em suas delicadas areias?

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Internet e conhecimento




Quem pode garantir sobre os resultados e efeitos da cultura “internáutica” na espécie humana?A relação entre o homem e a tecnologia implica sempre em incertezas, afora o fato de que possibilita um controle maior sobre o universo material  que nos cerca.De acordo com Lavoisier, tudo se transforma; de acordo com a entropia , a energia tende a se dissipar e se espalhar por todo o sistema(o que em si nos faz ter dúvidas sobre a avareza ou bancos!), de maneira que todos os instrumentos que desenvolvemos nos servem para controlar(em parte!) a natureza, possibilitar um pouco mais de liberdade para nela atuar e, inevitavelmente, sucumbir.
     Queiramos ou não , a natureza não está nem aí para o que somos ou fazemos.Se destruirmos a biosfera e com isso nossa própria espécie, o planeta vai continuar aí e, quem sabe, nasça algo parecido com o que hoje chamamos de vida. E se formos para as estrelas, se isso for nossa vocação natural para restabelecer o princípio da entropia?Teremos de construir outras línguas, outras formas de comunicação.Nossos mecanismos cognitivos se desenvolvem paralelamente aos nossos sistemas perceptivos.
    O que se discute hoje pelos especialistas são os limites colocados pelos recursos “internáuticos”, suas influências sobre a cultura, a democratização das idéias e dos pensamentos, a falta de profundidade na formulação desses últimos.Mas tudo ainda cai na especulação , na carência de dados e pesquisas mais conclusivas.Um alarmismo de plantão vaticinará que é o fim do mundo e que regrediremos aos estágios de cultura dos pitecantropos, apertando botões e mouses, enquanto otimistas tecnofílicos defenderão o contrário.Que seja...Só o ceticismo e o equilíbrio podem oferecer alguma clareza.O entusiamo(ter um deus em seu coração!) é bom como motivação, não como reflexão.Essa necessita de distância o frieza.O resto é arte, essa outra face da moeda misteriosa da existência.

     Será nossa racionalidade prisioneira de sistemas energético-cognitivos fora do nosso controle?Teremos que pensar menos?E como ficam nossas feras e demônios domados por séculos de domesticação civilizatória?
    Sei apenas que essas respostas ainda não estão disponíveis no google.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

breve reflexão sobre a condição masculina atual

Tudo bem: sou um cara à la antiga,  educado dentro de um sistema de valores já ultrapassado.O tempo passa e devora os valores antigos à medida em que envelhecemos.Embora faça pouco do grosso do sistema geral de valores de nossa sociedade e economia, ainda guardo “recidivas” de bons modos e certos comportamentos de antanho,Que fazer se a persistência da memória é sempre cruel?Somos vítimas desse território estrangeiro que é o passado.
     Confesso que em minha juventude flertei com valores do antigo e hoje  desprezado feminismo.Desprezado porquê?Sabe-se lá... Mas naquela época o contexto político colocava certas reivindicações que hoje não são bem vistas.Também não sei porquê.Continuo achando o ser humano um bicho conservador e violador da entropia, mais ou menos como as formigas.E no geral vejo os homens, aqueles mesmos do sexo masculino, como caçadores e guerreiros frustrados pelas facilidades que a tecnologia estabeleceu.Restam a mentira e a bazófia.Dizem então que a “identidade” masculina está em crise.E que as mulheres passam por mutações psicológicas dentro da nova era.Para mim não passam de ajustes impostos pela grande máquina produtiva de riqueza e exploração que respira no planeta, ainda que quase acabe com o ar do mesmo.
     Particularmente vejo os homens , sexo masculino, fadados à extinção.O moderno e quase invulnerável capitalismo descobriu que as mulheres fazem  tudo o que os homens fazem, no mesmo nível de competência, reclamando menos e ganhando em média menos.Perfeito!É tudo o que o sistema e a máquina do mundo precisava.E, além de tudo, elas são mais resistentes fisicamente porque a sabedoria da natureza faz a fêmea da espécie ser, em média, menos vulneráveis que os machos.Como não são vítimas de determinismo hormonal que as faria desconcentrar-se para a caça pro criativa, podem concentrar  esforços e energia para a gestação de fetos e riqueza( através da força de trabalho).Nada mal, hein?Além do mais, quem precisa de músculos  desde a  utilização do princípio da roldana e da alavanca?
     Sinto dizer, companheiros de sexo, mas somos um “gênero” ultrapassado e inútil para o funcionamento da máquina do mundo.Em breve, no admirável mundo novo que está sendo forjado, procriação sem necessidade masculina.
    Contudo, enquanto o apocalipse da produção não vem, ainda esperaria que algo do passado sobrevivesse.
    Meu avô me dizia que as mulheres são todas umas loucas, no que ele tinha razão.Só não me avisara que o resto do mundo também era.Imaginava que a “loucura” , a “fragilidade”(?) feminina era fruto de congestionamento hormonal.E, na época , nem os mistérios da TPM tinham sido desvendados...Dizia ele: um ser que sangra normalmente todo mês e não morre depois de muitos anos,  imagine se fosse para a guerra!Invulnerável!
   Depois de algum tempo a gente desiste de vez de entender a cabeça das mulheres.Um pouco mais de reflexão e a gente desiste do ser humano em geral.
   Consigo entender sem problemas a estúpida e natural agressividade masculina, muito mais que as eternas “duplas mensagens” dos valores femininos.E depois dizem que foram gregos homens que inventaram a dialética...
   Mas nessa barafunda toda, como homem, tento imaginar o que se passa na cabeça da “mulherada”(por favor: sem nada depreciativo!).As “super-marias”, trabalhando como o demônio e ainda se preocupando com a estética de objeto sexual imposta pelos quadrantes do consumo.Não deve se fácil.Sem contar os filhos, em geral ficando nas mãos delas porque o casamento virou instituição com decurso de prazo cada vez mais exíguo.E o que restou da vocação caçadora masculina se restringiu a bares, por exemplo.Haja calmante e cartão de crédito!O capitalismo agradece.O antigo feminismo que pregava o fim dos valores masculinos opressivos passou por uma reengenharia daquelas: nada de subverter o sistema.O negócio é igualdade na produção.O coquetismo foi substituído de vez, não pelo ideário revolucionário, mas pela ótica e a ética do trabalho bem feito.A mulher é a mais perfeita guardiã da mediocridade, naquilo que o termo significa de adaptação aos valores médios dominantes.Oprimir em larga escala ainda é com os homens.Mas elas chegam lá.Não é à toa que conhecidos meus , de faixa etária parecida, não sabem mais como se comportar.É fato: as mulheres são espécie mutante.O que fazer? Não espere algum Lênin trazer a resposta.Onde se enquadram os valores masculinos tradicionais, onde não há a necessidade de caçar animais ou fazer guerra?No futebol, nos “lupanares” fantasiosos da pornografia agressiva, no crime sem sentido?Chega um ponto em que se tem mais vontade de matar um semelhante(em geral , homem) do que fazer sexo com uma mulher.Aviso: o negócio é não deixar elas falarem muito do trabalho, senão o assunto não acaba.E pior: ao contrário dos homens elas vão mentir pouco sobre o tema.A mentira feminina  só tem valor se for alicerçada pela sutileza.Como disse: salvo as exceções, os homens são seres primitivos, redundantes e previsíveis.Até sua loucura é mais escancarada.A mulher sempre é um abismo insondável, mesmo quando é simples de mente.Afinal, a bioquímica interna é mais complexa nesse caso.
     Volto ao tema: que fazer?Sinto dizer: nada a fazer a não ser esperar pela passagem lenta do tempo rumo à extinção nossa, sexo masculino.Quem sabe agirmos como estruturas  museológicas  ambulantes, com a ação dentro de certos valores de cavalheirismo formal, algo inconcebível dentro da vulgaridade dominante nas relações entre homens e mulheres atualmente.Seria passadismo doentio?Pode ser.Mas confesso: não sei o que fazer quando, no trânsito, andando devagar(detesto correr de carro)  sou acossado por outro atrás de mim.No volante uma furiosa mulher, mais furiosa ainda com a lagarta em que me transformei.Faço pouco caso e, em poucos momentos, lá vem o gesto obsceno por parte dela.Se fosse agir com minha natureza primitiva interior, eu saltaria do carro e a espancaria(talvez até a estuprasse se sentisse algum tipo de atração pervertida).Como não estamos em guerra declarada e  sou um civilizado, sigo regras e sou bem educado em meus mecanismos de controle auto-repressivo(até sou daqueles que dá lugar no ônibus),não vou agir dessa maneira desproporcional.Nada   a fazer a  não ser rir de mim mesmo e da própria infeliz, desesperada para ganhar grana e se endividar um pouco mais, pegar o filho na escola, ir ao médico, comprar remédio, encarar alguma cara azeda de chefe, etc,etc,et.Por isso o mundo continua, independente da frieza e dureza masculinas, futuramente melhor administradas pela evolução natural da espécie, com a conseqüente extinção dessa espécie primitiva que joga futebol e compra revista de mulher pelada.E que ocupa mais de noventa por cento do cérebro pensando em suas futuras algozes.
    As feministas tinham razão: o mundo é das mulheres.
    Como diria um amigo meu:o “olho que tudo vê “ será substituído pela vagina que tudo suga.Todo o mistério começa e acaba ali mesmo...

    Mas sem revolução.Apenas com uma natural evolução.

domingo, 8 de maio de 2011





Só dirige e comanda quem não sente ou sente pouco.Talvez os regentes de orquestra pudessem  escapar disso.Porque quem comanda ou dirige deve sim antecipar o que os outros sentem para melhor dominá-los.Isso porque sentir pode inibir a ação.Sentir demais pode apenas nos desviar daquele instinto natural de passar por cima de tudo e todos para alcançar os objetivos.Assim é a vida, assim funciona esse abjeto mundo dos homens que somos todos nós.

Se a frase “a mulher faz o homem” se aplicasse a mim, imagino  em que laboratório de patologia teria eu fincado moradia.

Não sei bem como ou por onde anda minha geração, mas sei bem como anda sua degeneração.

Quando persistentemente sonhamos a mesma coisa, esse sonho passa a ser tão importante quanto aquilo que não é sonho, ou seja, a realidade.E se chega a um ponto em que não podemos mais distinguir entre sonho e realidade.Daí a multidão de alucinados que compõe a humanidade.E o medo que cada sonhador desperta nos demais.

Às vezes sou atingido por síncope de ninfolepsia(termo usado por Nobokov, o autor de Lolita, e que nada tem a ver com pedofilia), talvez   por baixa de defesas de caráter.Mas isso é facilmente contornável com uma terapia intensiva à base de pílulas de senso do ridículo.








     Os amantes entusiasmados deveriam, ocasionalmente, passear por cemitérios, para sentirem o quão efêmero pode ser o que sentem, o quão frágil é a vida e todas as coisas, nessa coisa tão passageira que é a existência.O problema do mundo moderno é o tédio, porque se vive muitas coisas em mais tempo, enquanto no passado tinha-se que viver as coisas em menos tempo.Hoje queremos a vida eterna.Seria interessante se o corpo não sofresse muito.Mas como ficaria nossa paciência?
     Melhor do que ser pós-moderno é ser pré-arcaico.Isso porque, historicamente, não temos garantias sobre como se desenrolarão as relações entre homem e tecnologia.O fascínio pela técnica ou pelo progresso pode ser enganoso desde que não se relevem valores humanísticos(embora haja pessoas, inclusive intelectuais, que abjuram dos humanismos!), arduamente adquiridos ao longo de nossa evolução.Para quem acredita que a história da humanidade não passa de um moto-contínuo onde nada se modifica, é melhor encostar o burro na sombra e esquecer de tudo, vendo a carruagem passar, o tempo e os fatos tudo devorando, ficar rezando esperando o nirvana chegar a bordo de uma tv a cabo.Com isso se contempla uma estranha vontade inconsciente de se estar longe de tudo e de todos, embora se imaginando próximos.Como não podemos para o tempo-  embora o que  está no passado já esteja parado- podemos desconfiar mas nunca ser presas fáceis do pessimismo, porque este não está de acordo com as leis da sobrevivência.Freudianos ortodoxos podem ser  entediantes...Talvez pela falta de humor.A arte pode aliviar um pouco.
     A natureza pouco está aí para o que acontece com a gente.Sorte de quem tem fé e acredita em coisas transcendentes além da hora de se cruzar o último rio.Se o destino genético quiser, o que podemos fazer?Quem sabe mexer na genética.Acabaremos por viver mais, sofrer menos com o acaso biológico.Outros problemas de nossa existência talvez nem tenham solução.Porque, queira-se ou não, a solução final será a mesma, no silêncio do vazio que nos espera além das terras de onde viajante algum retornou, além do último rio, seja ou não com ponte.




Quem pode garantir sobre os resultados e efeitos da cultura “internáutica” na espécie humana?A relação entre o homem e a tecnologia implica sempre em incertezas, afora o fato de que possibilita um controle maior sobre o universo material  que nos cerca.De acordo com Lavoisier, tudo se transforma; de acordo com a entropia , a energia tende a se dissipar e se espalhar por todo o sistema(o que em si nos faz ter dúvidas sobre a avareza ou bancos!), de maneira que todos os instrumentos que desenvolvemos nos servem para controlar(em parte!) a natureza, possibilitar um pouco mais de liberdade para nela atuar e, inevitavelmente, sucumbir.
     Queiramos ou não , a natureza não está nem aí para o que somos ou fazemos.Se destruirmos a biosfera e com isso nossa própria espécie, o planeta vai continuar aí e, quem sabe, nasça algo parecido com o que hoje chamamos de vida. E se formos para as estrelas, se isso for nossa vocação natural para restabelecer o princípio da entropia?Teremos de construir outras línguas, outras formas de comunicação.Nossos mecanismos cognitivos se desenvolvem paralelamente aos nossos sistemas perceptivos.
    O que se discute hoje pelos especialistas são os limites colocados pelos recursos “internáuticos”, suas influências sobre a cultura, a democratização das idéias e dos pensamentos, a falta de profundidade na formulação desses últimos.Mas tudo ainda cai na especulação , na carência de dados e pesquisas mais conclusivas.Um alarmismo de plantão vaticinará que é o fim do mundo e que regrediremos aos estágios de cultura dos pitecantropos, apertando botões e mouses, enquanto otimistas tecnofílicos defenderão o contrário.Que seja...Só o ceticismo e o equilíbrio podem oferecer alguma clareza.O entusiamo(ter um deus em seu coração!) é bom como motivação, não como reflexão.Essa necessita de distância o frieza.O resto é arte, essa outra face da moeda misteriosa da existência.

     Será nossa racionalidade prisioneira de sistemas energético-cognitivos fora do nosso controle?Teremos que pensar menos?E como ficam nossas feras e demônios domados por séculos de domesticação civilizatória?
    Sei apenas que essas respostas ainda não estão disponíveis no google.




Confesso que estou farto de misticismos de botequim.Não suporto mais, dá-me engulhos aguentar um blá-blá-blá espiritualista de gente que vive em shoppings e com a cabeça voltada para a moda e os bons costumes.Tudo jogo de cena para ocultar carências de significância vital.Auto-propaganda zen, estou fora!