domingo, 25 de novembro de 2012

Questão outonal às portas de dezembro

E aí, adentrando a passagem do tempo, na “curva perigosa” da maturidade –ah, que maldade! – pode-se derrapar num amor.Ai que dor, ai que dor! Exercita-se a razão para se domar a emoção, mas tanta sublimação só dá mesmo embromação. Um animal agonizante ainda uiva, uma lâmpada ainda dá um brilho estertorante antes do filamento virar resíduo. De algumas coisas já abri mão, definitivamente, de entender. Arte, filosofia, sabedoria e tantas outras coisas para driblar o imponderável. O roteiro geral da peça é mal escrito, “fábula contada por um idiota, cheia de som e fúria, significando absolutamente nada”, como dizia o autor de Hamlet.Erudição ou verniz para polir o instinto bruto, a animalidade que nunca se perde completamente. Estetizar tudo para se atribuir um sentido a tudo que se sente? Por que não?Sem contar o faz de conta de que morte não chega ou não existe, apenas em acontecimentos como velórios ou enterros. Só os outros morrem? Podemos sofisticar a ilusão, mas isso não implica em solução, quando muito em dissolução de mentiras que não encaramos. Essas questões e dilemas “outonais” são mesmo de difícil solução, no meio de um mangue afetivo que se situa entre o otimismo primaveril  e o pessimismo invernal(ou seria infernal?). Mas, que fazer?  O amor, tanto quanto a morte, não marca hora ou, pelo menos, o relógio onde se marcou a dita cuja se perdeu em algum canto inacessível; sem contar que quase sempre estamos atrasados e já perdemos o metrô da história(porque não se usa mais bonde), a bateria( a nossa ou do relógio, tanto faz) já foi pro brejo e não há recarregador disponível. No fim, a mesma correria atrás de coisas que começamos a perder desde do início, sem que venhamos a perceber. E vamos tocando, vamos tocando...Apesar das derrapagens, o negócio é rezar para que haja acostamento

domingo, 4 de novembro de 2012

coisas várias de outubro


A dialética perdida
entre o feijão e o sonho
ah, isso não sei onde ponho.

A consistência da verdade
 dessa mentira que todo mundo é
cair nisso, é coisa simples de mané?

Se penso sempre no real
e fujo, apresso o passo no ideal
seria isso a solução bestial?

Mas cair na rima boba e fácil
não só do poema mas da vida.Basta!
Que essa nunca larga de ser madrasta




2
Ser servo da beleza em todo assédio
nada custa à inteligência marca passo.
Mas se mesmo essa beleza causa tédio...
Torpe e cruel destino, esse erro crasso!

Em contraponto ao conhecido poema: que me perdoem as belas  a que não me furto o assédio, mas a falta de loucura...Nossa, que terrível tédio!

Contraponto sobre a Rua Aurora

Na Rua Aurora eu nasci
Na aurora da minha vida
E numa aurora cresci
                M. de Andrade

Na Rua Aurora não nasci
Mas uma aurora em minha vida
Nessa Aurora descobri

Mas nessa aurora em que nasci
Ah, aurora!  logo a vi partida
Na Aurora em que me perdi.
               Sergio M  arques



O olhar de Andrea


 O olhar da moça balança no espaço
Vai ao alto, longe de seus cristais luminosos
a se afogar em estrelas e sonhos.
Para onde vai esse seu olhar, moça?
Retornou de algum passado remoto
Transitório entre a nuvem que passa e o vento que passa
jornada dupla, duplo olhar
para no vértice de luar escondido em sua fronte
da beleza recolhida
        a pureza
      ir além da vontade?
E para onde vai o olhar de toda mulher,
estampado em arco-íris de desejo
pela luz irradiada de seu coração?
Ah, a impotência da razão humana,
esse bruto sentido dos limites masculinos!
Onde recolher do olhar da moça,
Clepsidra rara escandida pelo capricho dos deuses,
todas essas cifras de mistério de seu universo
de moça olhando para o alto?
Que fazer da beleza desse olhar,
mar distante inalcançável num albergue de infinito
eternamente afogado em estrelas!


Como homem sonhou-se guerreiro,armas simples, sem corte
No embate com a dura pele de seu semelhante: pouca sorte.
Falhou o pacto entre o caos do mundo e o desejo fundo
Tanto sonho, bruteza e ternura: perdeu-se pelo mundo.



Reflexão:
Quando nos apaixonamos, parece que um outro eu que somos nós nos rouba de nós mesmos, para nos devolver apenas quando já deixamos de ser aquilo que chamávamos de nós.E nós mesmos deixamos de ser aquilo que pensávamos ser nós.

O fascínio da estranheza
Cristina,
estranha,
assanha tudo que no pensamento
é sopro de dúvida. Há firmamento?
E tudo quanto se perde no rumo do vento
Lamento, lamento...
Languidez a simpatizar com leveza de estrelas,
que no alto levam a simpatia que lhe devoto
Ah, lamento, lamento...
Você e sua leveza, tão delicada e frágil,
daquelas que faz doer o coração,
frágil, frágil...
Cristina, cris de cristal
descristalizada em seu ícone de olhar triste
roubado quem sabe de um pássaro que não mais canta

Me encanta, encanta...
e silencia, fulgura
 em sua original
figura
Flutua, flutua...







sexta-feira, 2 de novembro de 2012

sobre o dia de finados


Para falar a verdade, não vejo muito sentido no dia de finados.Os mortos não existem enquanto presença física, mas estão presentes entre nós , dentro de nós,  na forma de hábitos, valores, sentimentos transmitidos,formas de agir,comportamentos,pequenas subjetividades herdadas  a partir da  convivência com aqueles que não mais estão entre nós.Todo dia acaba, por isso, sendo dia dos mortos.Imaginem que houvesse apenas um dia do Amor.Bem, talvez nem estejamos tão longe disso...
     Somos memória em ação ; tantos e tantos que partiram mas continuam vivos em nosso cotidiano, em cada passo, em cada sombra que perscrutamos. Ou não seríamos nós uma forma de sombra dos que morreram.?As lembranças, as lembranças...Para quem acredita em vida depois da morte, fica mais fácil, já que as coisas e os entendimentos podem se reatar no futuro além dessa vida aquém morte.No meu caso, que não acredito em vida depois da morte, exerço essa forma mais desinteressada de amor que pode haver que é a lembrança dos mortos.Sem contar os mortos que nunca conhecemos mas de quem temos, quem sabe, o melhor do que eles eram em vida, por meio do milagre da criação artística, irmãos de alma que não conhecemos, a vivência de uma nostalgia de algo que não se viveu .Como disse o Drummond: no fundo, a morte não é triste e sim serena.
     Por isso, nesse dia de Finados, não vou saudar os mortos, já que faço isso a cada momento em que, dia a dia, a imortalidade de suas memórias na minha memória afirma a  própria negação da morte.Por que não saudar a vida por meio da morte?
     Sim, não vou saudá-los e sim saudar a mim mesmo  com todos esses mortos que habitam dentro de mim.