segunda-feira, 25 de março de 2013

A vida: inflexionável cotidiano

Como já disse um poeta, assim é que se faz a vida : de inflexível cotidiano.Por mais tecnologia que tenhamos, por toda confusão mental que se passe nesse mundo congestionado de recursos e informações, desde a era das cavernas até a nossa das  (in)certezas informáticas, faz-se de inflexível cotidiano todo palmilhar de existência de qualquer carcaça ambulante que chamamos gente.É, não há como fugir.Ainda que haja os hiatos nos congestionamentos de escrita dos fatos, as loucuras e ilusões, do amor à glória e fortuna, ainda que de súbito certas coisas nos deixem no céu ou no abismo, o todo se faz como um tecido falho de eventos incertos que se estende , até o momento em que topamos com a " mais indesejada das gentes".Nem precisamos da glória de algum monólogo shakespeareano a justificar a modorra e o tédio com que construímos essa face do universo que chamamos de nossa vida.Poderíamos, quem sabe, apelar para alguma loucura, ilusória ou real, coisa que até fazemos por vezes,  para cair fora dessa loucura maior e organizada da vida social e econômica.Todas as pessoas fantasiadas de cotidiano, na peça do dia a dia cotidiano, das falas cotidianamente medidas pela mentira nossa de cada dia.Tudo é muito engraçado e caricato, acredito mesmo que todo drama é comédia disfarçada.No fundo, viver sempre será mais difícil que morrer.Sem resposta, criamos algumas para justificar o cotidiano e suas crias, o tédio e o marasmo.Mas como, se o risco é constante e estar vivo já é um milagre, em verdade sempre foi? Não vou cair na solução metafísica ou religiosa, poderia apelar para o budismo, não me faltariam argumentos.Argumentos?Não vou ser presunçoso a tal ponto.Quem sabe, cotidianamente, consiga achar algum, eu, tão inflexionavelmente cotidianizado  na busca de justificativas para o injustificável, figura ridícula e tola que sou, como qualquer um que se acha no cotidiano nosso de passo a passo.Mas a vida segue em seu cotidiano, estejamos ou não aqui, ela nem estando aí para a gente.Lá no alto, as estrelas não têm cotidiano.Toda alegria festiva só existe por causa de nossa imaginação.E isso inclui olhar para estrelas.Não temos certeza de onde fica a fronteira entre mente e corpo, às vezes ela até desaparece em certos momentos, como no sexo ou em alguma forma de êxtase alternativo, fora dos escaninhos do cotidiano.No fundo, talvez sempre nos sintamos, cotidianamente, roubados de algo, extirpados de algo maior pelo qual ansiamos voltar, ainda que não saibamos o caminho de retorno.Mas, enfim  - que remédio! -,  somos levados a seguir caminho, a carne fraca e, felizmente, não carregada de pecados, a não ser que você seja um cristão crente, vendo esse mundo como um templo de dores, à espera de um paraíso além da outra margem da vida.Por mim, estou fora disso.No meu cotidiano, inflexível realidade aparentemente inamovível, vou seguindo, cultivando a minha loucura particular de cada dia.Cotidianamente sereno.Já que tempestade nunca vai faltar, mais hora menos hora.Mas, quem sabe, sempre pinta algum mistério de flores...Flores do cotidiano.

sábado, 23 de março de 2013

Luz na madrugada


                           Luz na Madrugada

Ah, a vida, a vida!Passa como um sopro e se estende como estrada invisível, ainda mais quando esta se abre como porta infinita pelos arroubos da juventude.Dessa incerteza toda , apenas a certeza de que o incerto sempre será uma supresa indefinível.
   A noite desfalecida, leve embriedade de álcool e luz de estrelas que não vejo.Sim, vou para casa, decidido, digo a mim mesmo, a rumar para a ilusão de morada - mas onde estaria a morada de minha alma? -, recostar-me e enfiar-me nesse simulacro de morte que chamamos sono.Tudo pronto, ainda preso à escuridão, a de dentro e a de fora, irei para casa, tarde da noite.
     Quando ela passa, uma espécie de raio de luz imprevisível que aparece nessa noite, noite ventre de veludos de negrume , antes dormentes, subitamente despertos, agora um frio percorrendo a alma pela luz de mulher que fende a madrugada.Surge como um demônio doce, daqueles que nos fazem descofiar do bem e do mal.E na loucura do artificial e do real,  nem ao menos noto que o dia amanhece, escuridão e luz, as duas devoradas pela claridade que vejo em torno dela.Ah, como sou ridículo, como adoro ser ridículo numa situação dessas!Por que será que sinto um sopro de eternidade ao passear ao seu lado acompanhado desse silêncio de nós e de tudo?Não sei, sei que nunca saberei.Os que não sabem que não sabem são cegos, os que sabem que não sabem procuram alguma luz.Projeção de ficções, esse meu coração se refestela com seu talhe doce de moça.
     Sim, eu sei, o sono será uma colcha de lembranças recentes, tanta beleza estreitada entre a treva e a luz da manhã albergada no sorriso de oceano de seu rosto.Lá fora o vasto mundo, tão pequeno e fútil em frente dos sonhos de sono e vigília em que me construo, ou que ela se constrói,moça-mulher-esfinge, um constante mistério nessa nuvem de dúvidas  que rompe a madrugada e se instala na pele.E serei obrigado a escrever algo, não contarei a ninguém, a não ser ao próprio coração, da curta felicidade arrancada às pedras  da vida fria. Equação sem solução na matemática estranha dessa existência mais estranha, do acaso de ver a luz na madrugada.Tudo é estranheza no curto reinado da felicidade.
                                                                              23 de março 2013

domingo, 17 de março de 2013

Reflexão noturna andarilha em 16 de março

Noite correndo, nas costas um peso indelével do mundo, olhando as pessoas no deleite de serem algo além do que são.O que sou , mal sei.Uma intangível tranquilidade guia meus passos sem rumo, numa noite sem rumo, como sem rumo são tantas noites; afinal, o mundo mesmo não tem rumo certo.Gostaria de ter mais certezas, além de uma ou outra coisa que julgo ser um acerto.Gostaria de ter o coração mais alegre, encontrar quem sabe um coração maior desse universo do qual me esforço a ser como célula quase invisível num organismo amorfo.Gritos e sorrisos espalhados pelos bares.Tantas pessoas, sei que não as toco, nunca poderia tocá-las como um todo, nem mesmo sei se posso tocar a quem me é familiar ou próximo.Ah, as falsas fraternidade etílicas!Olho as pessoas, destinos indefinidos e desconhecidos, berros, estridências e beijos largados pelo espaço da noite, arquitetura de escuridão envolvendo as estruturas da cidade.Não verei o vazio disso tudo, enxergo apenas a transparência do que finjo ver.No ar, aquele ar de noite banhado a luzes artificiais, nos paraísos artificiais definidos pelas vontades falhas.Olho as pessoas, vejo bem, enxergo as linhas e as formas, daquilo que se define como corpo das pessoas, olhos das pessoas, sorrisos esboçados, num e noutro canto um bêbado semi-acordado, eu ébrio de um silêncio absconso,  mortificação quase budista em meio ao festim de todos os impulsos animais, como o estrondo silencioso dessa multidão de pessoas que não toco, nunca tocarei.Passo a passo, como a flutuar numa nuvem de pedra, vejo as pessoas.O que são, para onde vão, de onde vêm, tudo faz de mim e delas todas esse silêncio que não se toca, de tantos seres que não se tocam, pela própria intocabilidade de todos os seres.De real mesmo, apenas o tempo.E esse não existe,  não passa de algo medido por aparelhos por meio de convenções.Existem apenas as coisas que se transformam e se interferem, exceto se forem humanos, pois estes vivem de ilusão da tocabilidade, mais abstratos, de certa forma, que essa abstrata vontade de se tocarem.Afinal, eu toco as pessoas?Ora, deixem-me então ficar comigo mesmo, na intocabilidade do vazio que se preenche com esse ser de sonho e fúria que chamo de eu.E se o universo todo for uma só substância?Quanta bobagem!A noite passa, eu passo, a ânsia do toque também.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Ai, que vontade de fugir!

Cada dia que vejo o noticiário, me dá uma vontade de fugir, juro!A comissão de direitos humanos na mão de um troglodita medieval, moleque arrancando braço de ciclista em alta velocidade, julgamentos com penas ridículos para crimes hediondos.Agora vem um papa, essa imponência fardada de mensageiro divino, representante claro da omissão de homens de batina frente a homens de chacina.Bem, que fazer, esse mundo está louco.Aliás, como sempre esteve, apenas a informação era menor.Posso me refugiar nos sonhos, mas o mundo sempre chega de fora, por dentro ele é outro, igualmente conturbado mas me parecendo mais humano.Mas a humanidade está fora de mim, não sou só no mundo, só existo em relação aos outros.Mas se os outros são uma outra forma do que sou, o que sou é sempre uma frustração do que eu e o resto do mundo poderiam ser.Nada a fazer.Passear pela arte e pelo deleite, pelas formas estranhas,misteriosas e belas desse mundo, tudo meio sagrado, de um tronco de árvore estranho às estranhezas das curvas femininas, minha solidez racional se desmanchando a um sorriso, no canto escuro de cada cotidiano um espanto constante.As loucuras da política e da violência estridente do mundo, e ainda me cobram se questiono o que é felicidade.Outro dia uma mulher ficou irritada comigo porque lhe disse  que ela era feliz por acreditar em felicidade porque eu, pessoalmente, não trabalho com esse conceito, para mim abstrato demais.Trabalho mais com a ideia  de dor menor, de número de frustrações menor numa existência, num universo que não foi construído para meu prazer.Ela me chamou de arrogante, de senhor da verdade, logo eu que só trabalho com o conceito de verdade relativa...Sorte dela se é feliz, se se  julga feliz. Otimistas sempre me pareceram pessoas mal informadas, pessimistas pessoas com informação demais.De minha parte vejo tudo muito aflito, os dias passando rápido.Estou vivo, mal sei se levanto amanhã, estou andando e driblando a morte e pouco sei sobre o  agora ou o amanhã.Arrogante eu, ou seria uma irritação dela para com a minha ironia?Disso não abro mão, não vejo como não enxergar as coisas desconfiando e ironizando, talvez um vício de caráter, confesso.
      Mas que estou cansado estou, teria vontade de fugir para alguma Pasárgada, mas não tenho amigo rei em lugar algum , embora, cá entre nós, não fosse mal uma prostituta bonita prá gente namorar, desde que se pagasse com carinho.Não como o personagem de peça shakespeareana, não vou trocar meu mundo por um cavalo, mas faria de bom grado uma permuta por esperança.Para aumentar a chance de perspectivas, nessas improbabilidades do dia a dia, na fragilidade do cotidiano cimentado por certezas voláteis.Mas que fazer, sempre somos condenados a um futuro, ainda que só haja presente.Habemos esperança.Isso me importa, pouco se me dá quem é o novo representante de Pedro.

segunda-feira, 11 de março de 2013

Bergman e o nazismo


Que Ingmar Bergman é um dos maiores diretores de todos os tempos, isso todo mundo já sabe.Pessoalmente, não seria leviano de minha parte dizer que eu seria uma outra pessoa, sob certos aspectos, não tivesse visto seus filmes.Que esse extraordinário artista tinha flertado com o nazismo, durante sua juventude, disso fiquei sabendo mais tarde.Mais velho, Bergman narra esse fato em sua auto-biografia, nomeada Lanterna Mágica.Nada a causar espanto: na época da segunda guerra havia muitos simpatizantes de Hitler em terras de Strindeberg; afinal, a Suécia fazia jogo com os dois lados, os aliados e o eixo.
    Bergman diz que, ao final da guerra, sabendo dos horrores do nazismo, ficou ele mesmo horrorizado com sua própria pessoa, caindo quase em desespero.Consciência de que, inconscientemente, fora manipulado como tantos outros milhares, milhões, de sábios a zé-ninguéns, pela paranóia nacionalista-esquizofrênica do nazismo,o imbecil sonho de pureza universal, esse romantismo perverso de viés psicótico.Assim são os homens, assim é a humanidade.E Bergman era humano, demasiado humano para fazer algo como Morangos Silvestres, demasiado humano para ver Hitler no alto de um palanque, uma multidão em êxtase o saudando, e ele mesmo gritando o nome do ridículo homem de gabardine e bigodinho.Bergman, esse gigante, naquele momento era como qualquer pessoa simples, um personagem típico de uma peça de um outro grande, Brecht.Mas Brecht era judeu e comunista(na verdade, mais um socialista utópico que , por certas conveniências, dialogava com os comunistas), perseguido pelo nazismo, desde jovem com a consciência política inexistente no jovem Bergman.
     Imagino Bergman, velho, lembrando disso, meio envergonhado, pensando: que horror, eu, despersonalizado numa multidão embrutecida e movida a agressidade, a mesma agressividade que devia entrar em ressonância com agressividades outras residentes em meu interior; que fazia eu lá(Bergman estava num intercâmbio cultural em 1934 na Alemanha), como podia estar participando daquele evento, liberando tantos  monstros que habitam nosso interior?
     Bergman narra que acompanhou as vitórias de Hitler, entusiasmado, assim como as derrotas, desolado.Para no fim, com a derrota final, a cruel revelação do que o nazismo fizera para a civilizada Europa.
   O sueco viveu na carne a presença do niilismo transformado em atitude política, o que pode levar a manipulações por outros.Assim funcionava o nazismo, assim funciona a mentalidade fascista, a qual pode se desdobrar desde a orientação político-partidária até a questionamentos de ordem místico-religiosa.Pensemos nesses pastores oportunistas e suas seitas recolhedoras de dízimos, às custas da infelicidade humana.O jovem Bergman, ainda a caminho de ser o grande Bergman, foi isso: uma consciência perdida no meio da inconsciência da turba furiosa e manipulada pela mediocridade, ao som wagneriano de ódio e ressentimento, essas matérias primas que produzem o organismo e o etos fascista.Porém, ao contrário de outros artistas que também defenderam o nazismo, gente de altíssimo nível como Pound ou Dali, Bergman viu a ficha cair, percebeu o horror daquela jogada, dentro do horror maior que cerca a existência humana no caos de incerteza e dúvida que formam nossa vida.Acredito em suas palavras, ao se dizer desesperado por descobrir o que era o fascismo e o nazismo.Coitado de Bergman; na época dele ainda não havia aquele grande líder iraniano, o tal de nome para mim impronunciável, da tal revolução obscurantista islâmica(me recuso a apoiar qualquer idiota apenas porque desce o cacete nas idiotices imperalistas americanas), para livrá-lo do peso da culpa, às custas da negação da realidade, dos horrores da segunda guerra ou dos holocaustos da vida. Mas assim é a vida, manipulação de inconsciência pelos limitados mas ardilosos poderes da consciência.Falar mais sobre isso é bobagem, muito melhor é ver qualquer filme do Bergman.O qual, como todos nós, era humano, demasiadamente humano.Quem já não cometeu seus pecados de juventude, sejam eles ideológicos ou não?O que importa mesmo é o que se lega de construtivo à humanidade, apesar de tanto ódio, intolerância  e destrutividade cultivados no cotidiano, em nossos interiores profundos, a alimentar pequenos Hitlers escondidos nos porões de nossas inconsciências.Nesse ponto, a luta sempre continua...Pelo seu cinema, Bergman levou a bom cabo essa empreitada.Felizmente, o jovem Bergman tem menos a ver com coisas como o Sétimo Selo, O Silêncio, Gritos e Sussurros,Persona,etc,etc e etc....

quinta-feira, 7 de março de 2013

Possível viver sem dilemas?

Já vi muita gente, intelectualizada ou não, dizendo abominar dilemas.Claro, dilemas complexos ou sérios, não a escolha de um sabor numa sorveteria.Ainda que escolher um sabor para outra pessoa possa ser algo sério.Pode haver gente que diga que não gosta de dilemas.Desconfio disso, sou condenado a ter sempre uma dúvida sistematizada, ainda que todos os meus sistemas não funcionem de acordo com um sistema maior do universo; afinal, sou homem, um violador de princípios desse universo.Digo que não vejo como viver sem estar mergulhado em algum dilema, a todo momento.O dilema não é simples dúvida, pois implica numa decisão de ordem ética e moral(desde que a tenhamos, cada um com a sua, específica).A decisão sempre se dá por ação ou inação.Podemos estar num estado em que, artificialmente ou não(droga,transe emocional,etc), por exemplo, somos presas de instintos quase incontroláveis.Controlá-los ou não já é um dilema. Aquela faceta de lobo que se antepõe à candidez da razão pura, homens divididos sempre.O que se deixa de fazer sempre levantará uma dúvida de acerto ou não.Se, cartesianamente, a alma fosse distinta do corpo,materialmente concebido pelas percepção da mente, no plano das idéias poderíamos resolver dilemas num plano idealizado.Mas uma ação de ordem puramente emocional não tem um corolário perfeitamente justificável.Deixei de fazer: estava certo ou errado?Os dilemas só vão se aclarando nas relações com outros dilemas; como sempre surge um novo, a vida é um tecido de ações combinadas com dilemas.Quem foge do dilema, abstém-se de ser o que o homem é: um ser trágico que sabe não possuir todas as cordas ou chaves que regem seu destino.De dilema em dilema se caminha em direção à morte.O que deixei ou não de fazer é a transposição de um dilema para outro dilema que alimenta o tecido do destino.Contradição ambulante.É isso aí.
WebRep
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sexta-feira, 1 de março de 2013

pensamentos curtos de fevereiro


O problema é que viver uma vida sem vícios pode virar um vício.

   As pessoas mais velhas deviam se comportar, com relação aos sonhos dos mais jovens, como um jardineiro faz com o jardim.Há flores, assim como há sonhos, de todas as formas.Flores, há as mais estranhas ou exóticas, algumas de destino incerto no jardim; mas são flores, e como tais têm lá seu papel no mundo.Talvez, por terem seus jardins já estéreis e secos, onde só brota mato chato ou erva daninha- esses também filhos da natureza - cultive-se um certo rancor por orquídeas esdrúxulas; mas, mesmo esdrúxulas, são orquídeas.Sempre melhor flor natural do que flor de plástico.Sempre melhor um sonhador equivocado do que um apático normatizado. Melhor qualquer jardim do que terreno baldio.

Êta, mundo louco!O tal do "espetáculo furioso e sem sentido, significando absolutamente nada" é assim mesmo: deixamos de fazer algumas coisas, de falar algumas outras, passamos por uma calçada e um muro cai em cima.Ninguém ousaria perguntar ao falecido muro, já em destroços, nem à vítima do mesmo, cujo futuro próximo é virar apenas ossos, o sentido disso tudo.O que se deixa de fazer nada mais é que um suspiro no interior do coração da vontade.E essa cessa de vez com o silêncio definitivo do coração.O problema é o outro coração que silenciamos durante a vida.

Pensamento de um conhecido meu, de 61 anos:" antigamente, em função das relações de opressão sobre a mulher, nos relacionamentos predominava mais sordidez por parte dos homens.Hoje, as coisas estão mais "equiparadas", parecendo que o interesse prático predomina sobre o sonho." Não deixa de ser uma opinião que se respeita.Eu acredito que, nisso tudo, o sonho submeteu-se ao prático.Mas a vida -que fazer? - subsiste em função do prático.Muito sonho não passa de mentira disfarçada e, a cada dia que passa, vejo que as diferenças entre homens e mulheres são extremamente mínimas.Daí fico me perguntando se fico mais ou menos feliz ou infeliz com isso e não concluo nada.Apenas concluo que meus sonhos se afiguram melhor que a realidade.Mas como essa não é feita para meu gozo, só levando tudo isso na gozação.

Eu pergunto então a um camarada de minha época: quantas vezes você não receia olhar para as próprias mãos, e ver o sangue deixado pelo punhal, o punhal com que violamos o peito do anjo de nossa juventude?Queira-se ou não, todo homem faz algum pacto fáustico ; nunca temos certeza de como nossa alma entrou nessa transação.Muitos dos que não quiseram assassinar seu anjo, partiram cedo de encontro a outros anjos.

De tanto me cobrarem maturidade, acabei caindo do galho.Mas aí ninguém quer aguentar o cheiro do fruto podre.

A verdadeira história da esfinge é que, ao se defrontar com a misteriosa figura, o pobre Édipo já foi devorado por ela.Depois houve uma farsa de que ele escaparia disso se a decifrasse.Em seguida, um golpe demagógico da Esfinge, fingindo se jogar no precipício, apenas para instilar complexo de culpa no já confuso Édipo.Mas como o Édipo era um masoquista, ainda teve que se envolver com a mãe, depois de matar o pai(por sinal, um senhor de modos condenáveis!), tudo para salvar um povinho preconceituoso e chegado a misticismos obscurantistas.Ah, o povo, o povo...Sempre seguindo o" primeiro que ergue uma espada ou cruz"(Terra em Transe, Gláuber Rocha) ou que disse decifrar o segredo de uma esfinge.Bem, depois disso, só furando os olhos.Mas os gregos sabiam das coisas, e essa versão não funcionaria bem , do ponto de vista educativo, nem permitiria o surgimento de novas teorias na caixola do grande Sigmund.