Já abandonei faz tempo o vício de falar mal de mulheres, tanto quanto o que não me esforço mais em explicar em mim o espanto pelas variações da Lua.Sinceramente, o problema não é mais o sexo mas sim o que no outro é de mim anexo.Certa serenidade até pode ajudar a quebrar o velho grilhão da carne; ainda que com suas limitações, já que recidiva e gripe nova nunca faltam.Mas aquele blá-blá-blá rancoroso, reflexo da frustração constante, disso quero mais me livrar.Canso muito- em verdade não canso tanto, senão nem ao menos me daria ao trabalho- de ouvir homem e mulher falando mal um do outro, independente mesmo dos caprichos de opções sexuais e, como todo ser social humanizado, sempre me fraternizei com esse comportamento de lamúria discursiva.Chega, não mais, basta!Tenho que usar então o que desenvolvi de raciocínio abstrato para transformar em abstrato a concretude maçante.Sem cair numa maçada.Óbvio que penso cá com meu zíper se essa bobajada toda vomitada pelo cotidiano de nossas conversas não nos faz aguentar as torpezas da vida, o envelhecimento, a sombra da morte, a bestialidade da rotina.Vai saber...
Será que se fala tanto mal em função de alguma busca de mitificação?Afinal, em eras de calendas gregas, os deuses se esbaldavam em futricas e ardis lá pelas bandas do Olimpo.Falar mal seria uma compulsão?No fim, tudo vira silêncio e esquecimento.Como na peça: tanto barulho por nada.Mas as serpentes devem, em conversas íntimas entre elas, se questionar como os humanos conseguem com linguinhas tão curtas fazer escorrer tanto veneno.Claro que o papo da maçã foi discriminação contra os répteis.
Que bom: pelo menos não falamos mal das árvores.Até dos bichos de estimação-namorados e amantes inclusos- fala-se mal com frequência.
Ontem a Lua estava linda e derramava prata pelas sombras da sarjeta.Hoje está mais fraca, quem sabe amanhã suma de vez sem dar satisfação.Mas não vou dar queixa dela para qualquer síndico do sistema solar; afinal, a Lua faz o que quer, aparece ou não segundo suas fases, cada uma meio louca, meio previsível, um pouco como cada mulher ou minha cara no espelho de manhã.Não vou falar mal da Lua porque os elementos do cosmo não se ajeitam com meu temperamento satúrnico...ou soturno.De forma que, racionalmente e pelo princípio da isonomia, vou estender de vez a prerrogativa a todas as mulheres.Mãe não conta porque mãe não é mulher, nem humana: é entidade.
Por fim, vou criar um pouco de vergonha na cara e por a mesma de cara com essa verdade: a de não mais justificar a frustração pela falação.Talvez funcione, talvez não.Mas espero que me tratem democraticamente.Ainda que eu saiba que laconismo não é lá muito comum em mulher, imagino que algumas venham a silenciar sobre as tempestades inócuas que as vezes criamos.Porque tanto falar sobre o que não podemos explicar?
Por isso, chega disso de falar mal das mulheres.Raios , que eu me esqueci da vida!Sem contar que tenho material de sobra para auto-crítica, esse exercício cotidiano de cinismo com que embalo meus sonhos frustrados e minhas raivas ocultas, bem maquiadas para a solicitude nossa de cada dia.
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