domingo, 28 de julho de 2013

Sobre o que mais penso na vida

Perguntam-me sobre o que mais pensei na vida e não hesito em responder:  mulher.E vejam que eu nem me considero um mulherengo; talvez eu o seja de outra maneira, criando idéias abstratas ou idealizadas sobre o feminino, objetivando, sem dúvida, algo de estético.Sim, porque confesso que também já gastei muito neurônio pensando em questões metafísicas, entrando aí o mistério do que nos causa prazer ou impressão de prazer, ainda que se passe pelo sofrimento para isto.
     Mas, sem dúvida, as maiores impressões de sofrimento ou prazer me foram causadas por mulheres.E por minhas limitações, inclusive com elas.Agora, mais resignado e menos hormonizado, me pego mais tranquilizado quanto a isso.
     Sempre pensei muito na morte; hoje penso mais nela por causa da idade e porque o cemitério da memória ampliou o número de lápides em minha vida.Amor e morte, as duas faces da vida.
    Dizia um grande poeta que o amor e a fome movem o mundo.Freud endossava isto sem pestanejar.Tudo o que se faz ou pensa gravita em torno de agregação ou desagregação nesta vida.Desisti há muito de explicar coisas como o amor ou a beleza.Podemos, quando muito, falar das emanações que envolvem essas coisas.Podemos criar discursos idealizados mas a realidade em si é inapreensível.Tentar criar sistemas explicativos para os fenômenos da vida sempre ocupou muito de meu tempo e esforço mental mas em nada resultou.Vivemos, brigamos, amamos, às vezes até matamos coisas ou pessoas, mas nada parece fazer sentido.E há mesmo um sentido nisso tudo, o de nada ter muito sentido.
    Quando mais novo achava que pensava muito em sexo; tinha que tirá-lo da minha frente para enxergar outras coisas.Agora tenho que tirar muita coisa de minha frente para pensar em sexo.Ou talvez pense o tempo inteiro, inconscientemente, porque tenho certeza de que não sei exatamente sobre o que estou pensando, até mesmo quando escrevo estas linhas, fingindo ser um outro consciente e sóbrio do que pensa mas, pode ser, não passando de uma imagem projetada de sonhos de um eu que deixa de ser este próprio eu ao escrever estas linhas que em nada me ajudam a pensar que posso pensar com certeza o que digo que é o que penso agora.E nisso dou um nó na própria cabeça.
    Assim como a morte, as mulheres me parecem inapreensíveis e inescrutáveis.Inútil tentar decifrar certas coisas.Será que tenho tanta necessidade de morte quanto de mulher, mesmo sem saber?Mas apenas a morte me parece mais concreta; ao contrário da mulher, ela não é sonho e sim fato.Idealizei tanta coisa em torno de mulher que até tenho medo das que me despertam mais interesse.Restrinjo-me então apenas à beleza delas, como entes físicos apreensíveis ao meu olhar e passíveis de elaboração abstrata em torno do que vejo.No fundo, nem vejo mais distinção tão clara entre o masculino e o feminino, exceto talvez as evidências hormonais e físicas mais latentes.Tudo é muito misterioso: o mundo, a ciência, a arte , a imaginação, o sexo.Nada dessas coisas aceito-as banalizadas.Daí que viver ainda seja algo complicado para mim.Poderia ser pior caso eu sofresse de alguma deficiência física.Teria que me adaptar; para tudo a gente tem que se adaptar, somos uma espécie muito competente para isto.´Só não somos competentes para ouvir o coração dos outros.
    A vida não me basta; não deve bastar certamente a  ninguém, apenas se criam compromissos e adaptações para que se pense pouco nisso.Eu, contudo, penso muito nisso.Não sei se é razoável ou não; tento racionalizar as coisas mas os mecanismos lógicos não se aplicam a tudo.Já houve época em minha vida onde acreditava que tudo podia se explicar pela matemática; mas veio o amor e tudo desabou.Hoje não tenho certeza de quase nada, de ninguém , do que todo mundo, inclusive eu, pensa.Vago anseio pela telepatia; mas acho que isso tornaria a vida social inviável.A não ser que conseguíssemos viver sem desejos; mas isto seria viver sem sentir e me parece que tudo que não é sentimento é morte.E como não sei o que é a morte, a não ser como uma hipotética ausência de tempo cronológico, como poderia saber o que é sentir?Sentir simplesmente é.Não foi nem será, simplesmente é; o resto é elaboração mental.Mas esta elaboração de nada serve porque mal sei se o que inexiste é o presente ou se o que apenas existe é o presente.Penso muito nisso, o tempo passa e, de repente, já morri.Fica uma ou outra coisa escrita, pensada, falada, desenhada ou pintada, quando muito; até virar pó e esquecimento.Nesse lapso do universo que se chama vida terrestre, tudo vira pó e esquecimento em algum momento.Ah, como penso nisso!
    Precisaria me reinventar durante todo o tempo, mas o tempo fica mais curto.Ou será que passa muito
depressa? Não sei.Gostaria de falar tudo o que sinto, já falei muita coisa , mas me pego mentindo a mim mesmo durante muito tempo.Tenho vergonha disso.Não deveria ter porque não há testemunha dessa minha tibieza introspectiva.E nem ao menos acredito no "olho que tudo vê".O nada me espera.Mas, ainda bem, não quero que ninguém forçosamente acredite nisso.E em nada, talvez.
   Tenho que aproveitar enquanto a morte não vem.Faço uma ou outra coisa em que julgo colocar um pouco de minha essência, mas me considero limitado, o que me constrange muito.Penso muito nisso; muitos burros assassinados por causa disso.
   Por isso a resposta nem sempre é clara, a frustração sempre plena.Na escuridão de partes indivisas de minha alma buscar algum tipo de luz que brote de meu pensamento.Ou de meu sentimento?Sei lá.A vida, a morte, a arte, o belo, o horror e a violência,  o espetáculo furioso da vida, o mundo tão vasto onde o eu tão pequeno se esconde,o selvagem domesticado dentro de mim  que me arranha com suas garras, ferindo dolorosamente as paredes do comportamento civilizado e comedido.Nisso sou muito infeliz.Ainda que tenha momentos de alta felicidade, em geral e infelizmente, vividos individualmente no jardim inacessível que criei para mim mesmo.Com isso devo parecer estranho.Penso muito nisso também.E penso nesse diabo de coisa estranha que é o amor.E também na ausência de amor.Para onde vão essas coisas se não as compartilhamos?Para quem ou onde ficam?
    Sinto forças que me propiciariam, quem sabe, amar mil mulheres , mas não encontro uma que eu julgue digna disso.Salvo acidentes sexuais de percurso; mas isto é banal demais. Mas talvez eu não passe de um presunçoso arrogante.Penso muito nisso.Como penso muito em deus; ou melhor, na ausência de deus.Para mim, morto; o que não faz com que tudo seja permitido mas que tudo seja meio sagrado.
    Mas, afinal, para que pensar nisso tudo se nem ao menos tenho certeza sobre o que mais penso ou  pensei.Ah, sim, disse que era mulher.É de se pensar...

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