O problema é que viver uma vida sem vícios
pode virar um vício.
As
pessoas mais velhas deviam se comportar, com relação aos sonhos dos mais
jovens, como um jardineiro faz com o jardim.Há flores, assim como há sonhos, de
todas as formas.Flores, há as mais estranhas ou exóticas, algumas de destino
incerto no jardim; mas são flores, e como tais têm lá seu papel no mundo.Talvez,
por terem seus jardins já estéreis e secos, onde só brota mato chato ou erva
daninha- esses também filhos da natureza - cultive-se um certo rancor por
orquídeas esdrúxulas; mas, mesmo esdrúxulas, são orquídeas.Sempre melhor flor
natural do que flor de plástico.Sempre melhor um sonhador equivocado do que um
apático normatizado. Melhor qualquer jardim do que terreno baldio.
Êta, mundo louco!O tal do "espetáculo
furioso e sem sentido, significando absolutamente nada" é assim mesmo:
deixamos de fazer algumas coisas, de falar algumas outras, passamos por uma
calçada e um muro cai em cima.Ninguém ousaria perguntar ao falecido muro, já em
destroços, nem à vítima do mesmo, cujo futuro próximo é virar apenas ossos, o
sentido disso tudo.O que se deixa de fazer nada mais é que um suspiro no
interior do coração da vontade.E essa cessa de vez com o silêncio definitivo do
coração.O problema é o outro coração que silenciamos durante a vida.
Pensamento de um conhecido meu, de 61
anos:" antigamente, em função das relações de opressão sobre a mulher, nos
relacionamentos predominava mais sordidez por parte dos homens.Hoje, as coisas
estão mais "equiparadas", parecendo que o interesse prático predomina
sobre o sonho." Não deixa de ser uma opinião que se respeita.Eu acredito
que, nisso tudo, o sonho submeteu-se ao prático.Mas a vida -que fazer? -
subsiste em função do prático.Muito sonho não passa de mentira disfarçada e, a
cada dia que passa, vejo que as diferenças entre homens e mulheres são
extremamente mínimas.Daí fico me perguntando se fico mais ou menos feliz ou
infeliz com isso e não concluo nada.Apenas concluo que meus sonhos se afiguram
melhor que a realidade.Mas como essa não é feita para meu gozo, só levando tudo
isso na gozação.
Eu pergunto então a um camarada de minha
época: quantas vezes você não receia olhar para as próprias mãos, e ver o
sangue deixado pelo punhal, o punhal com que violamos o peito do anjo de nossa
juventude?Queira-se ou não, todo homem faz algum pacto fáustico ; nunca temos
certeza de como nossa alma entrou nessa transação.Muitos dos que não quiseram
assassinar seu anjo, partiram cedo de encontro a outros anjos.
De tanto me cobrarem maturidade, acabei caindo
do galho.Mas aí ninguém quer aguentar o cheiro do fruto podre.
A verdadeira história da esfinge é que, ao se
defrontar com a misteriosa figura, o pobre Édipo já foi devorado por ela.Depois
houve uma farsa de que ele escaparia disso se a decifrasse.Em seguida, um golpe
demagógico da Esfinge, fingindo se jogar no precipício, apenas para instilar
complexo de culpa no já confuso Édipo.Mas como o Édipo era um masoquista, ainda
teve que se envolver com a mãe, depois de matar o pai(por sinal, um senhor de
modos condenáveis!), tudo para salvar um povinho preconceituoso e chegado a
misticismos obscurantistas.Ah, o povo, o povo...Sempre seguindo o"
primeiro que ergue uma espada ou cruz"(Terra em Transe, Gláuber Rocha) ou
que disse decifrar o segredo de uma esfinge.Bem, depois disso, só furando os
olhos.Mas os gregos sabiam das coisas, e essa versão não funcionaria bem , do
ponto de vista educativo, nem permitiria o surgimento de novas teorias na
caixola do grande Sigmund.
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