sexta-feira, 29 de abril de 2016

dentro e fora(poemeto)

Dentro e Fora
O lado de dentro é o lado de fora
Para todo o lado em que tudo aflora
Deflora a imagem derrisória do sonho
Esse, ainda não sei onde ponho
Suponho
Que esse lado de fora ainda demora
Adora
Ser o de fora além do de dentro
Fugir de tudo ser além desse centro
Que o de fora é o de dentro disfarçado
Cansado
De ser de fora ou de dentro, ameaçado
De causar mal , sortilégio amordaçado
A mim, nem fora nem dentro acantilado
Apenas na vida um tipo em si disfarçado
Amaldiçoado
De ser além de dentro e de fora marcado
Um pouco menos do que vil pensamento
Nesse longo, longo ir ao sopro de lamento.

quinta-feira, 28 de abril de 2016

flagrantes da sombra que sou e passa por aqui









Reflexão lamentosa de um brasileiro


 Chegando perto dos sessenta e tomado por inevitável melancolia que o outono da vida normalmente pode nos despertar, nada me enche mais de tristeza do que o desdobrar dos acontecimentos no Brasil.Seria o eterno retorno, o avanço reduzido- sempre tudo avançando devagar- ou a resignação com aquela frase de sempre: ah, as coisas por aqui sempre são assim?Ah, o problema da falta de caráter e coerência!Difícil manter a coerência por aqui.Mas não impossível.Salvar a alma antes de tentar conquistar o mundo? Passam os anos e conseguimos pequenas conquistas, as quais parecem poder desaparecer como uma névoa tão tênue quanto os ideais de amor ou beleza.E agora, não bastasse tudo isso, essa auto-desmoralização atingindo todo o âmago de nossa sociedade pelos lamentáveis eventos políticos que lançaram toda essa pseudo-luminosa nação aos porões de sua própria indigência.Muita, muita preocupação..Menos para os poderosos de sempre, esses que não pensam em coisas como justiça, racionalidade, mais igualdade, em nada mais humanitário ou ético que vá  além da ponta de seus estreitos narizes que miram apenas o lucro ou o poder. 
      Sempre me interessei pelo fascismo, além de seu passado histórico, como um fenômeno psicológico, social e político.Os três níveis sempre se entrelaçam nesse fenômeno que pode desaguar, facilmente, na famosa banalidade do mal, conceito tão caro e belamente estudado pela filósofa Hannah Arendt, ela mesma uma vítima do fascismo.Dizia-se que o fascismo em terras brasileiras era sempre um "pastiche" do original.Essa é uma visão reducionista e simplista.O fascismo é apenas um forma social e política de se exercer a violência.Por isso tem tantos vieses, nunca completamente elididos.Não poderíamos encarnar um fascismo do estilo desenvolvido na Alemanha ou na Itália, mas os elementos básicos de sua gênese, enquanto fato histórico, estão presentes em nossa cultura e formação.A base dele é o autoritarismo- algo tão evidentemente desenvolvido em nossa história e cultura, desde a época de colônia-, aliado, provavelmente, a fenômenos psicológicos neuróticos que podem ser capitalizados por interesses político e econômicos de poderosos.A cadela que gera a besta sempre está no cio.A manipulação extremista, a propaganda política de nossos meios de comunicação, com papagaios fascistóides- ainda que banquem os liberais por contradições evidentemente propositais em seus discursos- que vão além do "nós contra eles", com demonização de adversários , isso tudo pode criar um potencial de liberação de uma agressividade desmedida e irracional, alicerçada por nacionalismos sem sentido(tão fundamentais ao fascismo clássico) que, em última instância, podem demolir com qualquer edifício democrático construído., sem que haja a necessidade de se montar um estado policial escancarado como o que ocorreu por aqui na ditadura militar, ou em outros tempos de Hitler, Mussolini ou Stalin(esse mais devedor de uma gênese autoritária do czarismo russo que, permeando o regime socialista degradado, desenvolveu a burocracia soviética, continuando agora com as plutocracias de um Putin).Ignorar o autoritarismo que pode se estabelecer por aqui , usando leis e aparelhos do estado, é de uma insanidade cruel, assustadora.O ódio é irracional, sempre tolo como dizia Russell, muito mais fácil de se desenvolver que a solidariedade social.Essa última , por sinal, é desenvolvida e cultivada por pequena parte de nossa população, a qual continua presa de obscurantismo, preconceito, ignorância, manipulada por nossas mídias de plutocratas defensores de golpes e ditaduras que, depois de algum tempo, começaram a posar de bonzinhos.A única coisa boa para o político carreirista, sem ideologia, princípios ou sem escrúpulos é o poder, bancado, enquanto lacaio servil que é, à outra única coisa boa para o capitalista-pelo menos o médio, brasileiro, medíocre e degenerescente em relação capitalistas de outros países- em sua visão tacanha e estreita de nação ou comunidade: o lucro.O egoísmo não tem limite e o capitalismo, no fundo, foi o modo de produção que mais deu espaço para o melhor aproveitamento desse sentimento.Sem limite, regras, respeito a leis, ganancioso e sem escrúpulos ou visão mínima de democracia, só pode resultar numa "república de bananas" como temos visto a imprensa internacional nos tratar.Sem criarmos uma nova forma de ver o país e seu desenvolvimento, com novas relações sociais de convivência e desenvolvimento econômico,ficaremos assim, andando na base do arraste, dirigidos por políticos vermiformes de ocasião, rezando para escaparmos da tutelagem de baionetas, andando um passo para a frente, dois para trás.É o ritmo do bolero brasileiro, criado pela tragédia onde ainda chafurdamos, por vezes tomando um ar, no final intoxicados no miasma de injustiça e irracionalidade sociais que fazem o tecido ainda muito sombrio dessa grande ferida tropical que chamamos de Brasil.Nessa terra de tanto sol, vejo nossos rios feitos de lágrimas e sangue, nossas vastas praias de desalento e falta de esperança.Minha naturalmente lamentosa subjetividade apenas é agudizada pela crueldade de nossa realidade.O pouco que se ganha pode se perder mais facilmente do que o intentar em se ganhar algo de novo.E voltamos para o buraco, para a latrina perfumada onde sobrevivemos sob o sol do carnaval e de nosso etos cordial , aliviados um pouco pela neutralidade da tecnologia sempre crescente no mundo.E a violência uma pústula que sempre reaparece em nossa pele.Precisamos reinventar nossa genética histórica.Ou se acaba com o regime de Casa Grande e Senzala, ou a fazenda será essa eterna melancolia dourada de alegrias fugazes com que nos iludimos nessa "terra abençoada por deus" mas no fundo organizada e dominada pelo demônio.Ou isso, ou o fim.Mas fim de quê, se nem ao menos começamos um início?Talvez esteja eu doente da cabeça.Talvez a doença seja maior em todo nosso país, degradado a partir de um passado sombrio que sempre renasce em trevas de tempos em tempos.Maldita essa esperança que me prolonga o suplício!

quarta-feira, 20 de abril de 2016

manter os olhos atentos a quem está ao seu lado

Olhe sempre ao seu redor com coragem e receio.Veja só o belo tipo faceiro que está ao seu lado, como dizia propaganda de idos tempos distantes, e acredite que, se não morreu de bronquite, pode ter matado sua alma, até mesmo a humanidade dentro de si, no amálgama de inferno e céu que faz a carne do coração humano, essa estranha ponte entre deus e o diabo.Nem anjo ou demônio, o homem é mais um abismo do qual não imaginamos o que reside em seu fundo, se flores ou espinhos, aromas sutis ou fétidos, esperança ou desalento.Em horas assim, nos momentos de crise ou interregno da história(esse termo tão belamente usado por Gramsci em seus ensaios), assusta-nos ver para onde vão as pessoas.Se é que elas sabem para onde vão.E surge um estranho transpirar de ódio, esse ódio que parece nos iludir a ponto de imaginarmos ser ele o melhor de nós mesmos, esse ódio que nos contamina de fora, vendo-o transpirar dos olhos e corações alheios como um pútrido rio de fel, amargor e desesperança.Esse ódio contra o qual temos que lutar antes que nos faça de marionete pelos dedos ocultos da morte, essa senhora de vastos tentáculos que nem ao menos nos redimirá, apenas nos lançará ao nada.
Há sempre um punhal de prontidão ao seu lado, a ser cravado na carne crua de sua vida insana e sem sentido.E aquele que antes era o angelical espectro de uma amizade, pode nada mais ser que a horrenda face da discórdia e desprezo disfarçada na melíflua e mentirosa linguagem da concórdia.Nesse momento fiquemos atentos, que as sombras tentam nos roubar toda a luz do céu.E no fim, até mesmo a política pode ser um duelo entre treva e luz.Para isso temos que ter os olhos, a razão e a mais profunda voz iluminada do coração abertos.Para o bem ou para o mal, somos condenados à esperança.

domingo, 17 de abril de 2016

Devo desistir do Brasil?

Já faz tempo que não levo a sério esse negócio de patriotismo, definido por um escritor como o último refúgio de um canalha.Em realidade, vivendo em grupo, temos que fazer concessões.Uma das grandes que faço, ao conviver com meus compatriotas, é fazer de conta que levo o Brasil a sério.Sim, nasci e me criei aqui, uso sua língua nativa, amo muita coisa de sua cultura ou arte, devo ter muita coisa interna proveniente dessa matriz nacional em que me forjei.Mas confesso que me sinto um apátrida na própria terra em que nasci.Talvez seja algo mais grave, proveniente,quem sabe de uma incompatibilidade com a civilização.Mas não dá para viver sem ela,civilização, esse é o fato.Costumes, família, amigos, amores idos e vindos, arte, língua, isso é minha nação.O resto é injunção, circunstância.Agora passando a meia idade e se aproximando o outono de minha vida, decidi de vez desistir do Brasil.Não da vida, porque essa é maior que países ou nações.Daí que eu tanto acredita na mais universal das linguagens humanas, a arte.De mim tenho certeza que o país desistiu há tempos.Politicamente o país é inexequível.Não se forjam grandes nações, provavelmente, sem grandes revoluções ou convulsões.Mas já perdemos para nós, na História, a possibilidade de algo assim.Diz-se que democracia é um processo lento.Mas exige, provavelmente, um mínimo de caráter.À esquerda ou direita, isso parece ser algo um tanto abstrato por aqui.Porque tudo vira esculacho ou pastiche.
     Agora vivemos essa situação do impeachment.Espetáculo lamentável, transformado num circo servindo, como sempre, aos interesses dos poderosos.A Casa Grande quer mudar a administração da Senzala.Chega de feitor bonzinho.Vamos voltar ao angu de sempre.Reconstruir a unidade das forças progressistas, reordenar os planos de hegemonia, unidade na ação, se contrapor aos interesses dos grandes grupos ou da tibieza de nossa burguesada tapuia.Haja!Acho que entreguei os pontos e retornarei à minha subjetividade egoísta e pequeno burguesa.Afinal, não tenho grana, poder ou carreira, logo não existo por aqui; existo tanto quanto o proleta que leva uma vida de idiotia e exploração, satisfazendo-se com as migalhas do capital.Vejam só: nem ao menos aproveitei a bonança lulista econômica e conheci Miami!Tem gente que acredita em democracia por aqui.Eu não.Acredito em estado de "não ditadura", o que já é muito por nossa tradição, história e cultura.Confesso sinceramente: cansei.Só de ver sessões nesse plenário de Câmara já me desalento.Há décadas, por sinal.
     É claro que o impeachment não se define hoje.É um encaminhamento para futuras resoluções.Mas a imprensa vai explorar a situação e confundir a opinião pública para influenciar votações futuras em outras instâncias.Isso é claro.As pessoas não apenas, em media ou maioria, são desinformadas sobre nossas leis como são analfabetizadas em política, por tradição e cultura nacional.Bertrand Russell, num ensaio chamado Ceticismo e Política, dizia que em política pesa mais o irracional, o emotivo que o racional.Daí a ingenuidade do temperamento credo no constitucionalismo.E quanto mais a leis mudam ou são interpretadas de forma contraditória, mais frágeis e inconsistentes ficam para reger os povos que as criam.Bem, quem as criam sempre são as elites desses povos.E o que seriam as elites brasileiras.Caiamos na real: uma burguesia medíocre(a cara dela é mesmo o pato da Fiesp), uma classe média aparvalhada e precária(intelectualmente em média) e um povão disperso, inculto, desorganizado.Os ensaios de superação disso foram abortados, infelizmente, precocemente.Pequenos passos de reconstituição foram dados, mas isso é facilmente perdível em pouco tempo.E o PT, claro, foi cúmplice nessa tragédia que poderia ter um outro desenrolar.Do resto pouco se esperava mesmo.Eu, não espero nada.Minhas expectativas são realistas, as utopias apenas reservadas às regiões do espírito.Sabe-se lá com que cacos vamos reconstituir.Sem ampliação da consciência política, de todos estratos sociais, principalmente dos mais "populares", nada vai mudar.Ou a sociedade brasileira se "despaternaliza" ou não vai adiantar muito, afora o fato de que a tecnologia e recursos modernos vão facilitar a vida de todos, mas essa vida , no geral, vai continuar uma merda de absurdos inenarráveis, como a própria vida em si mesma o é.
Quem se apega apenas à visão constitucionalista dos textos e palavras legais(não esquecer que leis são escritas por homens que representam grupos, classes ou tendências sociais), sem tentar ver os interesses e forças econômicas que agem por meio de influências e representações nas instâncias, ou é ingênuo ou mal intencionado.Pode até ser as duas coisas ao mesmo tempo.Nós, povo brasileiro-essa abstração indefinida em textos , imaginações e discursos- temos sementes autoritárias e anti-democráticas visíveis em nossa "alma tropical".Há muita coisa de ditadura e preconceito embutida, em nossas leis, em nosso etos, em nossa forma de ser e se relacionar com o próprio semelhante..Falta algum tipo de superego coletivo para moldar nossa forma de agir, em pequenas e grandes coisas,sem precisarmos da tutoria de grandes pais, de salvadores da pátria ou de políticos inescrupulosos que dizem nos representar, representando na verdade a nossa ausência constante no universo político; talvez expressões de nossa imagem e semelhança.Sempre achei suspeita a ética dos fins que justificam os meios.Mas certos meios podem definir os fins.Os passos de um processo delimitam os resultados finais.E se forem torpes, o resultado não pode ser nada melhor que o abominável.
    Vão dizer que lutar é o mais importante.Bem, aos jovens, que peguem o bastão.Consigo apenas manter minha indignação, a qual certamente levarei para o túmulo; não poderei nem ao menos usá-la como moeda a negociar com Caronte.
    Passam os dias e chegam as rugas, apenas o tempo me faz, ao longo relento, mais e mais desistir do Brasil.Mas tenho eu o direito de desistir da humanidade?Não, a humanidade é maior do que o Brasil.O país é apenas um acidente a mais, na acidental existência do planeta no cosmo.

sábado, 2 de abril de 2016

resta persistir

 Há um certo viés pessimista na minha forma de ver o mundo.Às vezes vejo isso, em parte como algo misteriosamente filogenético, em parte por vivências ou leituras que, de certa forma, plasmaram minhas opiniões filosóficas.O otimismo veio por conta das leituras humanistas  as quais, principalmente na juventude, atuavam em conformidade com certo esplendor hormonal.Se a vida é fundamentalmente um eterno querer frustrado, nada pode nos espantar se a dor for a proeminência.
     Já se foi a época em que o ideário existencialista norteava minhas ações.Na verdade, sempre tive uma visão errônea dessas teorias filosóficas, confundindo a voluntariedade individual com a melancolia da asfixia pelo mundo. Contudo, nesse outono de minha vida, olhar para trás me deixa algo de luz no futuro. Não sei como, uma teimosia em construir uma esperança a partir das névoas melancólicas do dia a dia que nos corrói.O importante é essa estranha teimosia em persistir.
    Mas até que ponto a persistência realmente persiste, até que limites arrancamos do fundo da alma, dos porões sombrios de nossa inconsciência essa vontade de continuar?O mundo me parece uma grande esfera de onde não escapo, no inferno cotidiano de conflitos internos ou indisposições externas. Muito além desse mundo ser constituído pelo “inferno que são os outros”, fica-se na expectativa de que algo de ruim pode ocorrer sempre de forma inesperada.O inesperado é a certeza máxima, além das ilusórias bandeiras de paz fornecidas pelos limites da ciência.Sísifo sempre existiu, mas a rocha parece que cresce com o tempo.Asfaltariam até o topo da montanha?Ah, imaginar o Sísifo feliz, na orientação de Camus para que não nos percamos desse mundo ou dessa vida.A vida é o que nos resta , e nesse resto nos apegamos para escapar do impulso de nulidade e paz com que a morte tenta nos seduzir.Mesmo já estando meio mortos em vida.

     As guerras, o mundo social e o absurdo que nos cerca, os egoísmos sombrios de todos, as conveniências e as mentiras que vão desde o parente covarde até a vilania excrescente dos políticos profissionais, os egos acima de todas as vontades, as mesquinharias que estraçalham as paredes do coração, o mundo louco que nos cerca cheio de injustiças sociais absurdas, esse ódio imenso dentro da gente- e o que se faz com ele, santo deus!- podendo explodir por qualquer bobagem.O que está ruim sempre pode piorar.Resta apenas o quê? De que fiapo de esperança se pode imaginar um sol além de todos os limites de nossos desejos, da pura pele ardendo pelo desejo até os olhos secos de lágrimas de angústia que nunca se realizarão como dois faróis de esperança da alma?Restaria dançar ou se drogar.Como levar uma droga, a vida, sem outra droga?Sempre foi assim.Mas a vida, em si mesma, não está nem aí para a gente.Porque a vida não é uma droga.A vida simplesmente é o que ela é: a vida.Nós somos o acidente nisso tudo, o sonho frustrado dos deuses que nós cunhamos  a partir de nossa imagem e semelhança.Para  todo fim, eternamente, ternamente na coragem de uma só coisa: persistir.O resto é mistério.Viver nele não deixa de ser engraçado e dá um certo alívio, longe das certezas merencórias que nos iludem.Apenas uma coisa no fim: a vontade de resistir.Sofrendo pouco já somos muito mais do que felizes.Além de tudo, somos sempre uma nostalgia do que podia ser e nunca será, não é mesmo?A nostalgia de eternidade da qual nunca escaparemos, de onde viemos e para onde retornaremos.Sem perder o senso de humor, por favor!