Há um certo viés pessimista na minha forma de
ver o mundo.Às vezes vejo isso, em parte como algo misteriosamente filogenético,
em parte por vivências ou leituras que, de certa forma, plasmaram minhas
opiniões filosóficas.O otimismo veio por conta das leituras humanistas as quais, principalmente na juventude,
atuavam em conformidade com certo esplendor hormonal.Se a vida é
fundamentalmente um eterno querer frustrado, nada pode nos espantar se a dor
for a proeminência.
Já se foi a época em que o ideário
existencialista norteava minhas ações.Na verdade, sempre tive uma visão errônea
dessas teorias filosóficas, confundindo a voluntariedade individual com a
melancolia da asfixia pelo mundo. Contudo, nesse outono de minha vida, olhar
para trás me deixa algo de luz no futuro. Não sei como, uma teimosia em
construir uma esperança a partir das névoas melancólicas do dia a dia que nos
corrói.O importante é essa estranha teimosia em persistir.
Mas até que ponto a persistência realmente
persiste, até que limites arrancamos do fundo da alma, dos porões sombrios de
nossa inconsciência essa vontade de continuar?O mundo me parece uma grande
esfera de onde não escapo, no inferno cotidiano de conflitos internos ou
indisposições externas. Muito além desse mundo ser constituído pelo “inferno
que são os outros”, fica-se na expectativa de que algo de ruim pode ocorrer
sempre de forma inesperada.O inesperado é a certeza máxima, além das ilusórias
bandeiras de paz fornecidas pelos limites da ciência.Sísifo sempre existiu, mas
a rocha parece que cresce com o tempo.Asfaltariam até o topo da montanha?Ah,
imaginar o Sísifo feliz, na orientação de Camus para que não nos percamos desse
mundo ou dessa vida.A vida é o que nos resta , e nesse resto nos apegamos para
escapar do impulso de nulidade e paz com que a morte tenta nos seduzir.Mesmo já
estando meio mortos em vida.
As guerras, o mundo social e o absurdo que
nos cerca, os egoísmos sombrios de todos, as conveniências e as mentiras que
vão desde o parente covarde até a vilania excrescente dos políticos
profissionais, os egos acima de todas as vontades, as mesquinharias que
estraçalham as paredes do coração, o mundo louco que nos cerca cheio de
injustiças sociais absurdas, esse ódio imenso dentro da gente- e o que se faz
com ele, santo deus!- podendo explodir por qualquer bobagem.O que está ruim
sempre pode piorar.Resta apenas o quê? De que fiapo de esperança se pode
imaginar um sol além de todos os limites de nossos desejos, da pura pele
ardendo pelo desejo até os olhos secos de lágrimas de angústia que nunca se
realizarão como dois faróis de esperança da alma?Restaria dançar ou se
drogar.Como levar uma droga, a vida, sem outra droga?Sempre foi assim.Mas a
vida, em si mesma, não está nem aí para a gente.Porque a vida não é uma droga.A
vida simplesmente é o que ela é: a vida.Nós somos o acidente nisso tudo, o
sonho frustrado dos deuses que nós cunhamos a partir de nossa imagem e semelhança.Para todo fim, eternamente, ternamente na coragem
de uma só coisa: persistir.O resto é mistério.Viver nele não deixa de ser
engraçado e dá um certo alívio, longe das certezas merencórias que nos
iludem.Apenas uma coisa no fim: a vontade de resistir.Sofrendo pouco já somos
muito mais do que felizes.Além de tudo, somos sempre uma nostalgia do que podia
ser e nunca será, não é mesmo?A nostalgia de eternidade da qual nunca
escaparemos, de onde viemos e para onde retornaremos.Sem perder o senso de
humor, por favor!