quinta-feira, 16 de junho de 2011








     As pessoas são naturalmente desconfiadas frente a atitudes despojadas.Não é do nosso cotidiano conviver com a espontaneidade, exceto quando somos ativados por algum artificialismo químico.A máscara que carregamos é mutável de acordo com as circunstâncias ou conveniências de nossa sobrevivência.Com isso a desconfiança surge como mecanismo de resistência aos agentes externos atuando sobre nossos egos.O que chamamos de relações sociais é um emaranhado de interações de consciências.Essas, por sua vez, são condicionadas por impulsos represados pelos mecanismos  de controle social e civilizatório.É como se vivêssemos em uma peça sem direção e com roteiro indefinido, regido por um texto cheio de aleatoriedade.Viver não é apenas pensar para existir, desejar para se sentir presa da vontade, também  para existir.Viver é duvidar para existir, existir para duvidar.
     Sinceramente, fico em dúvida sobre tudo, não tanto pela minha capacidade de elaboração mental, mas sim pela grande capacidade de ilusão proporcionada pelos sentidos , iluminados pela surda luz dos hormônios animais.No fundo somos um amontoado de emoções mal conformadas, apenas amestradas.Toda emoção domesticada é emoção castrada.Por isso sempre me senti incomodado com a presença de animais domésticos, já que algo  de deformado ou deformante age na natureza íntima desses seres dependentes dos caprichos e mazelas do tão volátil temperamento humano.Tenho muita pena da dependência criada pelos animais.Nisso, o ar de desdém aristocrático dos gatos me fascina.Contudo, quem já não contemplou o horror da humilhação na cara de um animal ...ou de um ser humano?







     As pessoas na verdade não morrem; ausentam-se indefinidamente dessa vida d’aquém morte.


O ministério da saúde adverte: qualquer cidadão de meia idade pode ser acometido de síncope de ninfalepsia, a qual pode ser solucionada, sem problemas colaterais( exceto orgulho ferido), com terapia intensiva à base de pílulas de senso do ridículo.


A maior burrice consiste em acreditar além da conta nos limites da inteligência e na falta deles na própria burrice.Não querendo ser pessimista, mais difícil alcançar um manco correndo que escapar de cometer uma burrice.Parece que inteligência é escapar da burrice.Esta é o “grande espectro que ronda a humanidade”.


Se fôssemos mais rígidos em nossos critérios de julgamento e apreciação, considerando os valores éticos e princípios como elementos de constituição básica do raciocínio de âmbito social, poderíamos considerar que toda arte ruim é imoral; embora nem toda imoralidade se transforme em arte ruim.

        Se nem ao menos somos senhores de nosso destino, não arbitramos sobre a hora da morte ou do amor, nem escapamos dos gênios do acaso, como podemos ter certeza do que ocorrerá com o que produzimos?Mesmo o que vem ao mundo, ninguém sabe se será página virada e esquecida, talvez nem ao menos visto.Melhor ser visto do que previamente esquecido.No fim toda criação individual é fruto de um processo coletivo que deságua no individual para depois retornar ao coletivo.Afinal, não vivemos em sociedade e arte não é feita para a humanidade?Pouco nos importa se Homero era um ou muitos, mas que tenhamos a Ilíada e a Odisséia.De resto, tudo vã vaidade.

Não criamos do nada, embora para o nada voltemos.



        Não nos iludamos: por trás de cada “cavalheiro” pode se esconder um bárbaro, pronto para arregaçar as mangas e assentar o tacape na cabeça de alguém ou, mais civilizadamente, dar uma canetada que pode prejudicar a inúmeros.Entre o discurso oficioso de aparências e a ação prática efetiva pode haver uma distância abissal.Por isso, o “fair-play” é o anti-inflamatório da barbárie.

     Como dizia o Henry Miller, o diabo não precisa lá trabalhar muito; basta-lhe indicar os atalhos ou trilhos  que  levam  à beira do abismo.O resto se desenrola pela inércia usual de nossa natureza.


     Ora, viver esteticamente parece não ter muito valor se isso não se  reverter em outra forma de valor, capaz de adquirir coisas de valor discutivel; tão discutível  e relativizável  quanto se afirmar que beltrano ou fulano são pessoas de valor  por gerarem mais valor.Mas afinal, qual o valor de discutir isso?


   Ser exagerado é não ter limites ou não ter noção dos limites?Afinal, os limites entre o que se chama de bom senso e o ridículo são frágeis como uma bolha de sabão.E em muitas ocasiões temos que usar fraque e agir como chimpanzé.Nossos laços de parentesco com o primitivo ainda nã oram desfeitos.


     Outro dia li um  articulista dizendo que mulheres não gostam de demonstração de fraqueza.Afirmava: chore duas vezes na frente dela numa semana e sua namorada  o deserta.Um pouco  simplista para  meu gosto.Em todo caso não hesitaria: entre a namorada e o choro fico com o segundo, que é meu e ninguém pode tirar.Ao contrário da namorada que nunca é totalmente minha.


Sei que a circuncisão é praticada por islâmicos e judeus.Mas fico em dúvida se a prática não seria uma extorsão de Deus pela garantia da fé, ou se não seria uma forma primitiva de suborno em troca da garantia de serviços prestados pela providência divina.Tudo de somenos importância. Problema maior é o cortar outra coisa: a auto-determinação sem prestação de contas ao reino dos homens.Porque no de Deus, fica tudo no crédito.



Interessante que se critique tanto o narcisismo nas redes sociais.Ora, se todo fenômeno cultural compõe parte da superestrutura da sociedade, não vejo como um recurso de comunicação de nova tecnologia não espelhe a cultura dominante: individualista, apegada ao material e às aparências, pouco chegada ao raciocínio  de fundo e, essencialmente, narcísica.

Vejo muito se falar em Nietzsche  por aí, nos cadernos culturais, nas rodas intelectuais ou descoladas.Muito citado, pouco exercitado; diria mesmo que impossível de ser exercitado.Vivesse hoje e estaria, provavelmente, escrevendo, em algum hospício, livro de auto-ajuda para loucos, por achar o mundo de “fora”  demasiado desumano e desencontrado.


    Pode ser impressão minha, mas sinto  certa  misoginia consentida, assimilada pelo público, em boa parte dessas novelas de televisão, tamanha a quantidade de personagens “negativos” femininos.Seria pelo fato de que o grosso do públicos desses programas é feminino e são utilizadas as projeções fantasiosas de “competição” entre as mulheres?Trabalho para interpretação psicológica.Sei lá...


Pode até ser chato dizer,  mas minha vida particular não tem a mínima importância; como também sem importância  é a vida particular de todo mundo.Importante mesmo é o que é legado à civilização.E mesmo esta navega na própria sem importância  de poder desaparecer algum dia com o fim do mundo, independente  de calendário maia ou oráculos econômicos.


Confesso que tenho dificuldade de entender o espírito de um homem tolo, bem mais  do que entender as tolices de um homem espirituoso.


O  ARTISTA E A PUBLICIDADE

     Dentro das conquistas tecnológicas e culturais(?), podemos dizer que a publicidade é o viagra do artista contemporâneo.Não pode ocultar completamente a limitação daquilo que se julga de valor como criação natural.Mas ajuda o “espectador” a crer naquilo que lhe é apresentado como criação natural de valor.
     Quando Baudelaire escreveu os Paraísos Artificiais nem sonhava que algo parecido pudesse ocorrer no futuro.Outro dia li articulista afirmando que o viagra tinha contribuído mais para a humanidade que duzentos anos de marxismo.Exagero, sem dúvida, já que o marxismo nem ao menos tem duzentos anos.Mas vejo que o viagra dos artistas conseguiu em pouco tempo efeitos mais devastadores  que duzentos anos de mentalidade acadêmica.Afinal: chegará o tempo em que se amará ou se contemplará  às custas de viagras?


Sem motivos para muita inquietação: haja ou não vida após a morte estaremos unidos ao universo, seja da forma que for.E impossível não estar numa condição mais natural nesse estado do que na vida que levamos aqui nesse mundo.O fim do ego, isso sim, é a nossa grande inquietação...






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