quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Podologia aliada à cardiologia como solução

       Os podólogos cuidam da saúde dos pés, os cardiologistas da saúde do coração.E da alma, quem seria o especialista, o consolador?Fórmulas e sistemas não nos faltam para tentar explicar tais problemas.Quem sabe, uma junção entre podologia e cardiologia, uma união de técnicas para solucionar as dores da alma, alívio para os pés e aflições do coração, uma salmoura para os calcanhares gastos de nossas emoções conturbadas.
      Mesmo o mais cético dos seres não hesitaria, à luz de certo conhecimento adquirido por meio das pesquisas psicológicas,  em afirmar que a maior parte de nosso comportamento é determinado por fontes irracionais de nosso inconsciente.Ainda que boa parte das pessoas negue isso, acreditando no poder de sua racionalidade, do tal de "bom senso"(coisa rara!),esquecendo as bobagens ou loucuras que fazem na vida sem que consigam explicá-las. No cassino da vida, em que roleta arriscaríamos todas as nossas fichas nas emoções alheias, na previsão dessas emoções?Não há base estatística para isto.E a roleta sempre parece viciada.Quem foi a Las Vegas ou Monte-Carlo ou a qualquer lugar clandestino por aí,  sabe que se entra num cassino, a princípio, com o propósito de se perder.Ganhar é mero acaso, probabilisticamente determinado.
     Por outro lado, acentua-se no mundo moderno uma separação profunda entre o inconsciente e o consciente.Separação entre o "animal" humano e natureza.Todavia, essas potencialidades irracionais são manipuladas ao sabor dos interesses do poder ou do comércio, sem que a maioria se dê conta disso.Fruto de tal coisa, não seria descabido afirmar-se que nosso mundo social, no geral e historicamente, ou é neurótico ou simplesmente esquizofrênico.Talvez. Ou certamente?Quem sabe até mesmo o amor não passe de uma neurose prolongada.Seria mesmo a criança o pai do homem?Freud não explica, apenas nos conduz em meio às dúvidas.
    A vida é um troço louco e meio sem sentido, coisa constatada por tantas mentes filosóficas ou artísticas.Nos equilibramos na corda bamba das emoções e das frustrações, não sabendo bem o  que nos espera ao final dessa corda.Trapezistas de nossas incertezas.Haja bom humor para a empreitada.
     Assusta-me aquele que descrê da loucura do mundo ou de si mesmo. Melhor ser um louco sensato, se é que isso é possível.Pior cego aquele que não quer ver, mais louco o que não enxerga a própria loucura.Mas como enxergá-la, se somos educados e criados para ocultar de nossa consciência as sombras de nossa inconsciência?Vivemos ainda na pré-história de nosso próprio ser.Ao olharmos de perto o abismo que somos nós, mais do que tontos ou abismados(redundância!), ficamos desencontrados.Talvez quem se perde é o que se acha.O que se acha é um conjunto de possibilidades, mitigadas por ações do cotidiano, por agentes externos, sejam eles atitudes ou simplesmente agentes químicos.Endogenia de nosso próprio estranhamento.Contorna-se,  seja pelo trabalho(alienante ou não),seja pela arte,  pelo escapismo da satisfação instintiva( esta, sempre insuficiente), pela religião ou pelo medo, medo ao próprio medo.Medo de viver é natural porque a vida é mesmo amedrontadora.Acordar de manhã e estar vivo já é um espanto!
    Se tivéssemos tempo para reflexão sobre tais coisas, nem ao menos teríamos tempo para ficarmos deprimidos, a não ser pelas tragédias que nos pegam ou espreitam.Ser pessimista ou otimista depende de mecanismos de nossa vontade, são atitudes que tomamos, posturas que, consciente ou inconscientemente, moldam nosso caráter e formas de relacionamento.Se quiséssemos realmente conversar com as pessoas, iniciaríamos tudo a partir de perguntas sobre a infância daquele com que encetamos diálogo.Mas isso daria um trabalho dos diabos e cheiraria a psicanálise de boteco.E sabe-se que de sábio e louco, cada um tem um pouco.Ou nada, talvez.Nadificação da vida como forma de buscarmos a paz na condição de amebas.Ah, como devem ser felizes as amebas...
    Nada é mais áspero que as relações sociais.Só não percebemos isto pelos calos desenvolvidos em nossos corações.Nem todos são vítimas de patologias cardíacas, mas todos de calosidades cardíacas.Ainda não temos o remédio infalível para isto.De resto, a par da ciência e da tecnologia, a coisa mais desenvolvida, ao status de arte, pelo engenho mental humano é a hipocrisia.Esta o verdadeiro cimento da ordem social.Sim, calo no coração!Depois do sopro no coração, surge o calo no coração, esse centro simbólico da alma, a qual, sabemos, tem lá suas formas de contato conosco por meio de nossa mente.
     Ora, se os pés sustentam o corpo, o corpo sustenta a alma e o coração sustenta o próprio corpo, porque não haveria a possibilidade de relacionar todas essas funções?Os pés são tão estranhos como o coração, morfologicamente e plasticamente.Tanto o coração como os pés tendem a ser simplificados em suas representações imagéticas, criando-se símbolos plásticos reducionistas em função de suas complexidades visuais.Podo-cardiologia anímica?
    Por isso, acredito que uma união dialética entre a podologia e  cardiologia, com algumas pitadas sistematizadas de psicologia, quem sabe resolva problemas assim , antes mesmo da cura definitiva da asma ou do tédio sistemático da vida moderna.Quem sabe, a partir daí, o homem das cavernas que habita em nós se reencontre com o mistério do fogo que ele descobriu.Claro, por acaso...E saiba, finalmente, andar com os próprios pés.

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