Fragmentos pensados de uma
obra deliberadamente fragmentada
Como vivemos um estado de constante comédia
humana, somos vítimas de interpretações duvidosas de atores de talento
igualmente duvidoso.O grande problema está no instante em que as máscaras caem
e vemos o que está por trás das atitudes de fachada: muitas vezes o grotesco, o assustador, o
vazio.Pior: não adianta reclamar da direção nem cobrar a volta do ingresso.De
minha parte, contudo, prefiro meu amadorismo sem pretensão.
Por mais moucos que sejam nossos ouvidos, nosso coração
nunca deixa de ouvir os estranhos ruídos
que emanam das harmonias das esferas.Nem todo ruído causado pela balbúrdia do mundo
consegue encobrir nossa misteriosa escuta oculta.
A avidez por coisas novas quase que nos podam, nessa existência atual
de pouca contemplação, de ver a beleza que se oferece aos nossos olhos.Acabamos
por não ver essa beleza e sim apenas sua tradução.Ela passa ao nosso lado e não
a vemos, não pela ausência de olhos mas sim pela ausência de olhar.
Jt1
Lendo o noticiário cotidiano, ouso afirmar
que, fossem os símios mais unidos e conscientes, processariam Darwin por calúnia e difamação.
Se o homem é um contínuo de fragmentações porque exigir-se que o seja
unitário no amor?
A crueldade tende a ser espontânea, desorganizada.Quando se organiza vira coisas como os nazismos ou ditaduras mil espalhadas pelo mundo e pelo tempo.
A crueldade tende a ser espontânea, desorganizada.Quando se organiza vira coisas como os nazismos ou ditaduras mil espalhadas pelo mundo e pelo tempo.
A pior forma de ditadura é a que
antecipa o surgimento da vontade de liberdade do outro.
Por trás de cada pacato cidadão esconde-se
a latência de uma víbora digna de um
ditador..Por isso o povo é essa víbora de tantos tentáculos.
Há uma vantagem em se
produzir algo, artisticamente, não posto
em público, apenas em particular: se for uma grande porcaria você acaba por
ignorar-lhe o valor, seja pela condescendência de conhecidos ou pelo
autocentrismo da alienção.Chamo isso de esquizofrenia controlada ou síndrome de
falsa genialidade.
A mania de se emitir
frequentemente juízos de valor pode apenas demonstrar uma autêntica falta de
juízo.
Quando nos consideramos
loucos, boa coisa é uma visita a algum
hospício.Fica-se em dúvida se
a porta é de entrada ou saída, de onde estamos entrando ou saindo de
fato.Porque de direito todos somos loucos em alguma medida.
As leis da evolução têm sua
contraprova em muitos conhecidos nossos do dia a dia.
Em matéria de amor os fins não justificam os meios , e sim estes é que dão
sentido aos fins.
A paciência pode servir para
amadurecer o prazer.Mas o prazer pode fazer apodrecer a paciência.
Todos
veneram o culto aos artistas
loucos, fracassados ou atormentados em vida.Mas só aos famosos e conhecidos é
concedido a honra.E quanto à multidão de anônimos que soçobraram nas mesmas silenciosas
águas onde hoje descansam os famosos de hoje, desconhecidos de ontem , todos
igualmente loucos, fracassados e atormentados? Não seria o fracasso a condição
natural de vida?
JT
JT
Quem sabe por padecer de
idealismo compulsivo, não consigo levar muito a sério essas formas de amor
disponíveis e predominantes por aí.Afinal, com freqüência discurso se contrapõe
à prática.Essa mistura de sexo normatizado, economia, discurseira demagógica,
mentira e medo, que pouco ameaça a
integridade dos agentes econômicos ou a ordem das coisas no sistema, isso não
me atrai muito.Uma vã postura, pode ser. Não transigir em certos valores, por
nós cultivados, pelo menos pode servir a
um peso menor de consciência.
Civilização vive de instintos
controlados.Não há progresso sem alguma forma de repressão.Mas o tédio acaba
por ser o efeito colateral que pode se transfigurar de várias maneiras.No
fundo, todos querem paz e conforto, coisas que têm “preço” a ser pago, ainda
que seja nossa alma.O Mefistófoles que negocia conosco é bem criterioso e conta
com o aval de todos os demônios do “progresso”, ainda que isso custe-nos uma
parcela significativa do que restou de nossa alma , desabada no paraíso do
consumo, esperando uma redenção pelas
fórmulas mais simples que os milagres da ciência providenciarão.
sm
Ser só é ser de si mesmo o
mais que possível de se ser o que se é.
O máximo do que se é sempre
será o mínimo do que se pode ser.
Somente sendo o que se é nos
transformamos naquilo que podemos ser.
jt
Intervalo de descanso e
conversa no atelier.Reflexão: na verdade nunca falta amor na arte; o que falta
é, em geral, arte no amor.Porque, em potência,
o amor é vida, a arte corrige a
vida.Estetizado, o amor é intelectual, realizado é animal.Falta de amor é sempre
um pouco de falta de arte na vida.
Ficam lá esses artistas que, desde que não
muito domesticados ou hipnotizados pela grana, se debatem na própria estranheza
de ser, discutindo isso em meio aos problemas de grana e das mesquinharias que
preenchem o cotidiano.Mas quem é que não é um pouco estranho para si
mesmo?Tanto faz, animal ou intelectual, o amor é sempre estranheza.Faz-nos cair
do pedestal de nossas certezas.Estátuas são coisas duras, para viver ao sol e
sob o vento, como pessoas, embora estas sejam em si vida, enquanto as outras
são uma interpretação da vida.E interpretar, senão ajuda a compreender, pelo
menos nos serve para aprender a aceitação.
Minha metade domesticada
continua se debatendo- a bem da verdade, diga-se: em vão! – com os meus
demônios do cotidiano e da alma por questões evidentemente...domésticas.
Jt
Por nossos fracassos e sonhos quebrados,
somos condenados ao exílio de nossa desesperança.Por nossa teimosia e vontade,
somos condenados a empurrar rochas por crimes não cometidos.
A vida é como um experimento por onde
passamos, inadvertidamente, involuntariamente.É
uma viagem por onde o espírito transita através da matéria.”E como o
espírito é que viaja, é nele que se vive”.Pensar o que se vê é estar no que é
visto.Viver sem pensar é como viajar com os sentidos desligados.Em verdade
viveu muito quem pensou muito, numa dimensão de universo imaginário que nos
chega em parte pelas obras e criações de cultura que o indivíduo deixa.De nada
adianta viver muitas coisas ou passar por muitas situações sem que o risco da
morte esteja amealhado, ainda que seja simbólico ou imaginário.O risco existe
em tudo, vivemos oscilando entre a perda da vida e da sanidade(mental?Será que
existe?).Entre a matéria que pensamos ver, e o espírito que pensamos controlar,
claudicamos com os instrumentos de cultura com que a civilização nos ilude,
para continuar sua jornada de insignificância na vastidão do universo.
Andando pela noite.O mundo é mesmo teatro(do
absurdo?): as pessoas são como atores no palco; estão lá, mas não são o que
vemos.Os enredos até que podem ser bons, mas as encenações são sempre
defeituosas.Por isso se paga teatro: para se fugir do amadorismo da
vida.Mentira por mentira, é preferível uma bem concatenada.Há mentira mais
verdadeira que a verdade.
Cada vez mais creio que a
sinceridade, além de ser exercida por pessoas “francas”, só é possível
realmente às pessoas fortes.Para alguns, o espelho é mais do que um objeto de
ornamentação; acaba sendo um cruel confessor.Não há forma de ser sincero sem
ser cruel consigo mesmo ou com os outros.Mas muita sinceridade não passa de uma
forma de ornamento social.Por isso o silêncio pode ser uma grande forma de
eloqüência.
Como em algumas artes, nossa
vida talvez se desenrole em torno de uma quadra envolvendo solidez, tempo,
espaço e profundidade.A solidez é difícil porque tudo se desmancha ao redor,
tudo é fluido.O tempo nos escapa pelas mãos.O espaço é sempre um mistério
relativo e a profundidade frequentemente nos é negada pelas mazelas do
cotidiano.
Como sempre digo, uma mulher
pode não levar mais de dez segundos para decidir o que pode fazer com um
homem.No entanto, há muito homem que pode levar mais de dez anos para descobrir
o que não pode fazer com ela.
Dilema:são as afinidades e
não as diferenças que aproximam mais as
pessoas; contudo são as diferenças que produzem aquelas atrações inexplicáveis
que nos confundem e fascinam.Há algum critério objetivo e científico, à luz da
sabedoria dos especialistas, que explique isso?A vida não se organiza por
simetrias e sim por assimetrias.A cara metade ideal não seria mais que um
simples ideal.
Acabado esse festival de
futilidades do casamento real britânico, penso o seguinte: o único erro da revolução inglesa de 1648 foi, depois de
cortar a cabeça do rei, não cortar as cabeças do resto da nobreza
parasitária.Pena que Cromwell tenha morrido antes do tempo.Os franceses
acabaram sendo mais eficientes com sua guilhotina.
Na balança da (in)justiça
metafísica do mundo equilibrar o “som e a fúria” do individualismo romântico
com a reticência clássica do “não em estrondo mas em lamúria” não é tarefa
fácil.
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