quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Perigos da sabedoria da multidão

Brevíssima reflexão sobre o risco da irracionalidade coletiva que nos envolve no dia a dia


Eu me recordo de uma ocasião em que, andando pelo centro, flagrei uma confusão, onde um moleque estava aprisionado por uma multidão que o acusava de um roubo.O garoto já apresentava algumas escoriações e a multidão ululava um coro um tanto sinistro e justiceiro.Recordo-me que ao me aproximar falei, com um tom de voz mais e alto e com certo receio-afinal, como não sentir algo de  insegurança em qualquer tipo de multidão- que o mais correto seria segurar o rapaz ali, esperando a chegada da polícia.Foi quando dois sujeitos, tipos populares característicos da maior parte da população que por ali transitava, me encararam com olhares um tanto hostis, como se eu tivesse proferido algo de abominável, dizendo em alto e bom tom: por quê?Um “por quê?” reverberante como um rugido.Ah, a voz do povo....Será que deus não se alfabetizou?Não tem cartilha nos domínios celestes para se ensinar melhor esse povo?Quedei-me em meus próprios pensamentos, de certa forma me auto recriminando,  talvez com certo laivo ocasional de covardia ou sobrevivência,  por falar algo no meio daquele agrupamento desregulado.Mas também, por que não falar?Felizmente, dois policiais logo se aproximaram e levaram o garoto,  sabe-se lá para que destino próximo ou distante, e para um certo desgosto de muitos da multidão, incluídos os dois que me lançaram a dardejante hostilidade.Viver coletivamente sempre implica em conflitos, tomar posição pode ser corajoso e temerário ao mesmo tempo.No fim, tudo se debelou e, um tanto aliviado ainda que não conformado com alguma coisa que tinha experimentado ali, senti na alma o instante, um dos infinitos ao longo da existência do planeta e da humanidade, em que a civilização entra em choque com a barbárie.Asssim é.Assim será?Por coisas assim, sinto por vezes a vida em sociedade como um profundo tédio.E medo, óbvio.Mas, ao menos, consegui contemplar em mim o animal enjaulado...devidamente.Pelo menos naquele instante.

sábado, 12 de setembro de 2015

pensamento do dia

Tanta leitura de literatura pessimista ou cética e ainda sou assolado pelos mesmos sentimentos ou conturbações de juventude.Sem ceticismo ou pessimismo.Mesmo com queda de hormônios.Os cabelos, sorte minha, ainda os tenho, mais firmes que muitas das convicções antigas minhas que foram para o vinagre.Melhor vivo que morto, sempre.Principalmente se o imprevisto de sombra não se abater sobre a gente.Se vivemos para os sentimentos, temos que viver por meio deles.A teoria sempre nos engana.Sua cor é cinzenta; verde é a árvore da vida.Que comédia!O corpo pode degradar, o coração sempre a martelar, a alma nunca parando de sangrar.Fazer o quê?Tem gente que não nasceu para ser rasa,Atrás da gente aquele cemitério de lembranças, cada dia uma nova cova sendo feita.Mas não vivemos nele, ainda que os mexicanos façam festas em cemitérios no dia dos mortos.A vida pode até ser monótona; mas quem garante que a morte também não é?